quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Astrologia e Alquimia



"Sempre que os movimentos correlatos de Sol, Lua, planetas e estrelas são usados para trazer a ordem à confusão de nosso mundo cotidiano, existe astrologia”
Dane Rudhyar – Astrologia da Personalidade

Ando estudando Alquimia e parece que tenho material para me divertir por bastante tempo. O principal complicômetro é que a maior parte do material é iconográfico – feita através de imagens – e muitas vezes as descrições são “disfarçadas”, seja por medo de perseguições e proibições, seja para não mostrar os segredos para os não iniciados. De qualquer maneira, está sendo uma incrível viagem e estou entendendo melhor como é esse caminho de encontro com o Inconsciente e a maneira como a linguagem astrológica é usada aqui.

O Inconsciente trabalha e se comunica através dos símbolos, e ele é o nosso caminho para o Ser criativo que somos. Quando conseguimos criar em harmonia com o Inconsciente temos arte, intuições, sincronicidade, e quando brigamos com ele temos a loucura em suas diversas formas. Muitas vezes temos as duas coisas. E não brigar não quer dizer concordar: tem horas em que o Inconsciente vai falar que você é a rainha da cocada preta e é bem importante olhar para os próprios limites e dar uma risadinha de lado sabendo que não é bem assim. Isso também serve para o outro lado, quando a gente escuta que somos o verme do cocô do cavalo do bandido, e que também não é verdade. Essa é a razão dos gregos terem como seu maior pecado a hybris, que podemos traduzir como orgulho, arrogância. Não brigar é saber que o Inconsciente é muito maior que nossa consciência de eu, e assim, você pode criar, através da comunicação com essas manifestações, o Mundo Encantado da Cocada Preta com escritos, músicas, bordados, desenhos, danças e sei lá quantas outras maneiras, em um momento, e depois criar o Reino dos Vermes do Cocô de Cavalo - :$ - com os mesmos (ou outros que você acabou descobrindo) recursos, sem se identificar totalmente com esses mundos mas sabendo que eles fazem parte de você. Como explica Nancy Qualls-Corbett: “Podemos interpretar um mito subjetivamente, incluindo as imagens ou símbolos que o compreendem, a fim de descrever os atributos de uma função psíquica particular dentro de nós mesmos. Podemos perguntar, por exemplo: que parte de mim reflete o padrão de uma deusa ou de um demônio? Nesse sentido, os mitos, como os sonhos oferecem um ‘mapa rodoviário’ descritivo dos domínios inconscientes no caminho de individuação da pessoa, que é o movimento dela em direção à integridade. ” (A Prostituta Sagrada, 2002, pg 71). Para isso que Jung criou a técnica de Imaginação Ativa.

Nós enlouquecemos quando nos identificamos totalmente com o inconsciente porque ele é grande demais para que o ego o suporte, além de não ter valores como certo/errado, justo/injusto, bom/mau que normalmente nos orientam. Por isso são importantes nossas conexões com a realidade mortal limitada, para não se deixar arrastar. Trabalhar com materiais concretos ao se conectar com o Inconsciente pode ser de grande valia também. Era isso que os Magos, Bruxas, Alquimistas, Sacerdotes/isas e Xamãs em geral faziam desde sempre. E ainda fazem. 

Uma maneira bem eficaz do Inconsciente falar de seus Arquétipos (nome que Jung deu para a raiz que cria os símbolos no reino Inconsciente) é através das nossas emoções. Por isso quando o Arquétipo da Rainha da Cocada Preta surge nos sentimos tão grandes e melhores que o resto da Humanidade e quando é o Verme do Cocô quem surge nos sentimos tão abaixo de todos os Seres Viventes. Poder dar um passo atrás e olhar para o que se sente é realmente valioso nesses momentos.

Os estudos do movimento dos astros no céu e a busca por seu significado simbólico aqui na Terra está conectado a uma Ordem percebida através dos Ciclos que a Natureza nos oferece e de como o Humano se insere neles - já que ele não é algo solto ou diferente da Natureza -, assim como nossa consciência se liga ao nosso inconsciente. A Astrologia é uma ponte muito ampla e sólida entre a Consciência e o Inconsciente e por isso é usada por Alquimistas, Cabalistas, e outros especialistas em buscar uma ordenação maior na qual estamos inseridos. Durante tempos imemoriais chamamos a essa Ordem de Deus. Hoje temos muitos nomes para isso porque descobrimos muitas facetas importantes desse imenso Inconsciente, gigantesco como o próprio Universo que mal conseguimos vislumbrar. Aliás, começamos a teorizar a respeito de milhares de Universos paralelos ao nosso, então acredito que podemos multiplicar por muitos milhares o tamanho da nossa ignorância e daquilo que nos é inconsciente.

A Alquimia se diferencia de outros estudos por trabalhar sobre aquilo que se é para chegar ao potencial divino da matéria que já é também: o divino está ali, adormecido para alguns, escondido para outros, não algo que precisa ser introduzido ou buscado em outro lugar, pois o destino do chumbo é virar ouro, desde que trabalhado em harmonia com a substância vital universal que permeia tudo que existe. Em vez de buscar algo fora, no caminho árduo até uma alta montanha ou algum outro mundo espiritual, o alquimista trabalha a matéria para que ela se “conscientize” do ouro que é, assim como no processo de individuação nos conscientizamos de nossa integridade. Por isso o trabalho com a matéria a ser transformada precisa vir junto com a transformação da consciência do próprio alquimista, pois só quem conseguiu encontrar sua harmonia com o universo e alcançou o ouro em si pode fazer essa transformação no mundo. 

A Alquimia Ocidental teve seu momento áureo durante o século XVI, no Renascimento. São dessa época os mestres Agrippa (Heinrich Cornelius Agrippa von Nettesheim – 1486/1535) e Paracelso (Philippus Aureolus Theophrastus Bombastus von Hohenheim, conhecido como Paracelso - 1493/1541). A principal obra alquímica de Agrippa foi “De Occulta Philosophia”, Da Filosofia Oculta, e de Paracelso “O Sétimo Livro Supremo de Ensinamentos Mágicos”, o que mostra o quanto a Alquimia se integrava com a Magia e as Ciências Ocultas. Longe de ser o contrário de Ciência como hoje, ligado ao reino do fantástico, a Magia era exatamente essa busca por conhecimento da Ordem do Invisível: não só a Química, mas também a Física e a Biologia são filhotes das Ciências Ocultas.

Para se ter uma ideia de como era isso, “O Sétimo Livro (...)” de Paracelso, provavelmente o mais popular livro de Alquimia de todos os tempos (o meu comprei em uma banca de jornal a muitos anos atrás, mas ainda hoje você pode adquirir com facilidade e nas mais diversas línguas), começa falando de dores de cabeça e epilepsia, passando por efemérides planetárias e a vida longa do seu cavalo, para depois falar dos “segredos dos signos zodiacais”, dar receitas para acabar com as moscas e desvendar os tempos propícios para a transformação dos metais. E muuuito mais coisas interessantes e divertidas. Vale a pena adquirir o seu exemplar, caro leitor.

Nessas obras você encontra algumas associações básicas entre Astrologia e transformação Alquímica, e você vai ter que ter paciência para uma listagem de significados, pois aqui encontramos a base de pensamentos da Alquimia através da Astrologia.

Os planetas estavam ligados aos metais, de maneira que conhecer um planeta era conhecer o metal por ele regido e vice-versa:

    O Sol rege o ouro;
    A Lua rege a prata;
    Mercúrio, mercúrio;
    Vênus, o cobre;
    Marte, o ferro;
    Júpiter, estanho;
    Saturno, chumbo.

Isso significa que, não podendo pegar Saturno e manipulá-lo, você pode pegar o chumbo e ficar queimando, congelando, juntando com outros materiais, jogando ácidos e bases para ver como ele é internamente, e assim aprender mais sobre o planeta Saturno que anda em sua esfera no céu e trabalhar o Saturno do seu mapa natal, pois tudo compartilha da mesma natureza. E vice-versa: se você quer trabalhar o chumbo então precisa que Saturno no céu esteja em um bom posicionamento, em relação benéfica com os outros planetas e, dependendo do processo que você pretende fazer com ele, em determinado signo ou em associação benéfica com determinado signo. Depois falarei mais sobre cada um dos planetas e como eram utilizados na Alquimia.

Já os signos são usados para traduzir os processos de transformação alquímica, assim como traduzem os processos de transformação da Natureza através dos movimentos do Sol pelo zodíaco. Os 12 processos alquímicos são a base dos processos químicos modernos. Cada um destes processos é "dominado" ou "regido" por um dos doze signos do Zodíaco Ocidental como mostrado a seguir, com 3 tipos de decomposição, 3 de modificação, 3 de separação e 3 de união (as definições básicas, entre aspas, foram retiradas da Wikipédia, a menos que seja citada outra fonte):

  -  Decomposição através da Calcinação (Aries) – “a calcinação (lat. calx, calcinatio para o processo de se queimar substâncias diversas) é o nome dado a reação química de decomposição térmica, usada para transformar o calcário (CaCO3) em cal virgem (CaO), liberando gás carbônico (CO2) e outras reações análogas, nas quais esta transformação com remoção de gás está envolvida. Também é o nome dado ao processo realizado na fabricação de gesso, ou qualquer processo no qual a água (também chamada de água de cristalização) é removida de sais hidratados (por exemplo "soda calcinada"), bem como na fabricação de porcelana, na qual a água ligada as moléculas é liberada, durante o processo de sinterização. Na prática, o conceito calcinação é empregado de maneira ampla e descreve o tratamento térmico aplicado a quaisquer substâncias sólidas (por exemplo minérios) visando (...) a remoção de uma fase volátil quimicamente ligada a um determinado sólido, a decomposição térmica (de uma ligação química), a produção de um óxido (quimicamente semelhante à cal), a mudança de uma estrutura em substâncias cristalinas. ” 

Creio que é simples conectar esse processo com o signo de Aries, não? Um fogo que decompõe a matéria retirando toda a água e tudo que é volátil! Essa não parece uma descrição muito mais precisa do Fogo Cardinal do que a pequena chispa geralmente associada a esse signo?

    - Decomposição através da Digestão (Leão) -  “quebra dos componentes dos alimentos em moléculas menores, passíveis de absorção e posterior utilização pelo organismo, ou seja, os processos implicados na conversão de alimentos em substâncias adequadas à absorção e à assimilação. A digestão é o conjunto das transformações químicas e físicas que os alimentos orgânicos sofrem ao longo de um sistema digestivo, para se converterem em compostos menores hidrossolúveis e absorvíveis. Ela tem a função de manter o suprimento de água, eletrólitos e nutrientes do organismo, num fluxo contínuo. ”

Leão é exatamente esse Fogo sob controle que fornece o calor necessário para transformar os alimentos naquilo que necessitamos para viver bem transformando aquilo que ingerimos em compostos que supre as necessidades pessoais do meu organismo único. Não é à toa que o Plexo Solar se localiza na região do estômago. 

   - Decomposição através da Fermentação/Putrefacção (Capricórnio) – A Fermentação e a Putrefação são processos feitos por microrganismos sobre compostos orgânicos, mas no primeiro temos um processo controlado e no outro não. É como se a putrefação fosse uma fermentação com oxigênio que resulta na destruição dos tecidos em vez de transformá-lo em algo útil para nós. Fermentação é um processo de “liberação de energia que ocorre sem a participação do oxigênio (processo anaeróbio) que compreende um conjunto de reações enzimaticamente controladas, através das quais uma molécula orgânica é degradada em compostos mais simples, liberando energia. A glicose é uma das substâncias mais empregadas pelos microrganismos como ponto de partida na fermentação. (...). Para algumas bactérias anaeróbias o gás oxigênio pode ser letal, restringindo a ocorrência desses organismos a solos profundos e regiões em que o teor de oxigênio é praticamente zero. A esses organismos damos o nome de anaeróbios estritos. Há, no entanto, outros organismos que são considerados anaeróbios facultativos, uma vez que realizam a fermentação na ausência de oxigênio e a respiração aeróbia na presença desse gás, como é o caso de certos fungos (Saccharomyces cerevisiae - levedura) e de muitas bactérias. ” Como resultado da fermentação temos adubo orgânico, fermento para pão ou cerveja, por exemplo. Já “Putrefação é o quinto estágio da decomposição do corpo de um animal morto. Pode ser visto em termos amplos como a decomposição de proteína em um processo que resulta num eventual colapso da coesão entre os tecidos e a liquefação da maioria dos órgãos. É causada pela decomposição bacteriana que resulta em odores. Em termodinâmicas, todo o tecido biológico é uma loja de energia química, que, quando não seja mantido pela manutenção constante bioquímica do organismo vivo, começa a hidrolisar em aminoácidos quimicamente mais simples como componentes orgânicos. A repartição das proteínas de um corpo em decomposição é um processo espontâneo e a hidrólise de proteínas é acelerada com as bactérias anaeróbias do trato digestivo que são responsáveis por consumir, digerir e excretar as proteínas celulares do corpo. A digestão bacteriana das proteínas da célula enfraquece os tecidos do corpo. Como as proteínas são continuamente discriminadas em componentes menores, as bactérias excretam os gases e os compostos orgânicos, tais como o grupo funcional putrescina e cadaverina, que transportam o odor nocivo de carne podre. ” Aqui temos não só a decomposição dos corpos mortos, mas também o chorume do adubo orgânico, por exemplo, e tudo aquilo que conectamos com “cheiro de morto”. 

Desde muito tempo se associa Saturno, o regente de Capricórnio, com a Morte, assim maiúscula, como aquel@ que traz o limite à vida humana, presente em toda e qualquer tragédia e que se tenta enganar para continuar vivo. Saturno sempre foi o Grande Maléfico por isso. Apesar da fama de Escorpião, é Capricórnio quem nos fala da Vida e Morte dentro dos contornos da Sobrevivência. A mortalidade inevitável é um limite inegável, que coloca em dúvida a nossa participação do divino, que questiona os mais desenvolvidos santos e iluminados: uma das comprovações de que alguém era santo/iluminado sempre foi (e ainda é) a não putrefação do corpo físico. Aliás, muito interessante pensar nessas coisas e nesse processo capricorniano no momento em que Plutão transita por esse signo. E ainda tem gente que insiste em dizer que Capricórnio é simples. Mas aqui também vemos o outro lado da Morte, que é a fermentação, a possibilidade de se fazer pão e cerveja ou vinho, alimentos básicos do ser humano por todo o planeta a milhares de anos. É interessante notar que a diferença dos dois processos aparece para nós principalmente através do cheiro que os microrganismos produzem; o odor de fermentação nos atrai enquanto temos repulsa pelo odor de putrefação. Longa conversa com budistas, aqui...

- Modificação através da Congelação/Coagulação (Taurus) – Tanto a congelação quanto a coagulação tratam de transformar um líquido em um sólido, sendo que no primeiro processo fazemos isso através do resfriamento e no segundo através da adição de eletrólitos que vão provocar a aglutinação do sangue, por exemplo.

Touro, Terra Fixa, também é facilmente reconhecido nesse processo de transformar coisas fluidas, como água ou sangue, em coisas sólidas, não? Touro traz em si exatamente a concretização das intuições e sonhos que impede que a vida se esvaia por alguma brecha mal fechada e isso trará as mudanças de estado naquilo que vivemos. Processos taurinos exigem a consolidação das coisas. 

- Modificação através da Fixação (Gêmeos) -  O ato de fixar quimicamente algo pode ser usado hoje em dia tanto pela Engenharia (“operação que torna fixo um corpo volátil”) quanto pela Biologia (“operação pela qual um tecido vivo é morto por um fixador, com o fim de se realizar um exame microscópico”). Também chamado de “chumbador” e usado na construção civil, a fixação química coloca um composto líquido, através de injeção ou ampola, em lugares de difícil acesso ou muito pequenos para se colocar concreto e quando ela entrar em contato com o ar se solidifica. Quando se trata de fixação química para análise biológica celular, histológica ou patológica, fixação é um processo químico pelo qual “tecidos biológicos são preservados da decomposição ou alteração indesejada para fim de exame: a fixação elimina qualquer reação bioquímica em andamento, e pode também aumentar a resistência mecânica ou a estabilidade dos tecidos tratados”.

 Como associar fixação com o signo chamado de “borboleta do zodíaco”? Na utilização biológica de fixadores essa associação fica simples, pois apesar da “inconveniência” de se matar o objeto de estudo – como na história de Mercúrio e a tartaruga transformada em Lira -, o objetivo da fixação é impedir o movimento biológico natural, que levaria à putrefação, ao mesmo tempo que endurece o tecido para que resista aos tratamentos posteriores. Esse é um raciocínio geminiano, que busca o conhecimento “objetivo”, de preferência sem a influência daquilo que é muito vivo, emocional e/ou orgânico, que possa atrapalhar a racionalidade do saber. Quem já fez mestrado e doutorado sabe que chega uma hora em que você tem que “matar” seu objeto de estudo para poder escrever e descrevê-lo, senão você ficará eternamente colhendo dados. Essa é a base do conhecimento científico de laboratório com a qual trabalhamos ainda hoje.

   - Modificação através da Ceratização (Sagitário) – Na verdade a ceratização é um ciclo – também chamado cornificação – onde as células epiteliais se transformam em células córneas, mortas. “A pele elimina diariamente cerca de 6 a 14 mg de escamas ou células mortas, que são substituídas por outras células epidérmicas, as quais gradualmente se ceratinizam. No processo de corneificação, em que se forma a ceratina, há progressiva desidratação celular, com decomposição gradual do citoplasma e do núcleo. Essa camada de células mortas funciona como um envoltório impermeável, que protege a pele contra agentes mecânicos e químicos e constitui barreira contra a penetração de bactérias. Oferece resistência à penetração de água, mas certos gases e substâncias voláteis podem atravessá-la. Substâncias lipossolúveis, estrógenos, vitamina D e sulfonamidas são absorvidas com certa facilidade. Óleos e gorduras minerais podem penetrar na pele através dos folículos pilo-sebáceos. Quando a continuidade da camada córnea é prejudicada por afecções cutânea ou traumatismo, ela se torna menos impermeável. A pele assegura o equilíbrio interno do organismo. A epiderme, com a camada córnea, é a mais vital. Sem o revestimento de ceratina da camada córnea, o organismo perderia líquidos, secaria e morreria. Ao mesmo tempo, o tegumento protege o organismo contra a penetração de agentes tóxicos e bactérias. “ 

A pele é o maior órgão humano, o que já facilita a associação com Sagitário, mas é nesse processo de proteção e equilíbrio do organismo feito pela camada mais externa da pele que vamos reconhecer melhor os processos de Fogo Mutável: aqui temos a modificação através daquilo que absorvemos do mundo externo e também através daquilo que deixamos do lado de fora. O fato de se tratar de células mortas como no processo geminiano não é mera coincidência. Nossos valores culturais e religiosos (também os valores que muitas pessoas hoje estão chamando de “espiritualidade”) nos protege e dá significado para aquilo que vivemos, além de definir o que entra ou não na nossa vida. Interessante notar que a ideia de trauma cutâneo torna a pele mais aberta a agentes tóxicos, assim como a psicologia afirma que os traumas psíquicos nos tornam mais vulneráveis a pensamentos e emoções toxicas que muitas vezes resulta em Fundamentalismos religiosos e/ou ideológicos.

    - Separação através da Destilação (Virgo) – “A destilação é o processo de separação baseado no fenômeno de equilíbrio líquido-vapor de misturas. Em termos práticos, quando temos duas ou mais substâncias formando uma mistura líquida, a destilação pode ser um método para separá-las. Destilação é o processo de vaporizar um líquido para depois condensá-lo e recolhê-lo em um outro recipiente. Um exemplo de destilação que remonta à antiguidade é a destilação de bebidas alcoólicas. A bebida é feita pela condensação dos vapores de álcool que escapam mediante o aquecimento de um mosto (uma mistura açucarada) fermentado. Como o ponto de ebulição do álcool é menor que o da água presente no mosto, o álcool evapora, dando-se assim a separação da água e o álcool. O petróleo é um exemplo moderno de mistura que deve passar por várias etapas de destilação antes de resultar em produtos realmente úteis ao homem: exemplo gasolina, óleo diesel, querosene, asfalto e outros. “

Autoexplicativo do processo virginiano, não? Separando coisas aparentemente inseparáveis para torna-las úteis. Mas é bom observar que “Em teoria, não se pode purificar substâncias até 100% de pureza através da destilação. Para conseguir uma pureza bastante alta, é necessário fazer uma separação química do destilado posteriormente. ” Uma pequena provocação para os virginianos...

   - Separação através da Sublimação (Libra) – “A sublimação é a mudança do estado sólido para o estado gasoso, sem passar pelo estado líquido. (Poderia parar aqui para falar de Libra, mas vamos mais um pouco). O ponto de sublimação, assim como o ponto de ebulição e o ponto de fusão, é definido como o ponto no qual a pressão de vapor do sólido se iguala a pressão aplicada. Sublimação (as vezes chamada de ressublimação) também pode ser a passagem direta do estado gasoso para o estado sólido. A sublimação é característica de substâncias que possuem pressão de vapor no ponto de fusão maior que a pressão atmosférica. Dessa forma, na pressão atmosférica a substância desenvolve pressão de vapor suficiente para vaporizar completamente. A naftalina, assim como o iodo são bons exemplos de substâncias sublimáveis. A sublimação pode ser usada (também) para purificar sólidos. O sólido é aquecido até que sua pressão de vapor se torna suficientemente grande para ele vaporizar e posteriormente ressublimar numa superfície fria colocada logo acima. O sólido é então contido na superfície fria enquanto as impurezas permanecem no recipiente original. ”

Em suma é a técnica que se associa ao processo libriano por ser usado quando um dos componentes da mistura sólida sublima facilmente, isto é, passa diretamente do estado sólido ao estado gasoso, por aquecimento, e do estado gasoso ao estado sólido, por arrefecimento, ou, em linguagem simbólica, pode ser abstraído e depois retomar sua forma com facilidade. Assim como em Virgem, o processo libriano se associa a uma purificação da matéria, só que como é um processo de Ar não há nada líquido/emocional envolvido. Freud chamou de sublimação ao artifício do ego de transformar emoções proibidas e o impulso sexual (a energia da libido) em atividades aceitáveis socialmente. Importante na adaptação de um indivíduo no seu meio envolvente, porque possibilita o seu enquadramento social, mas também construtor de neuroses quando exagerado. Processos librianos sem dúvida.

   - Separação através da Filtração (Escorpião) - “Filtração ou filtragem é um método utilizado para separar sólido de líquido ou fluido que está suspenso, pela passagem do líquido ou fluido através de um meio permeável capaz de reter as partículas sólidas. A filtração é utilizada para realizar a separação do líquido de uma mistura sólido-líquido ou sólido-gasoso. O equipamento mais utilizado é o filtro de papel, como o usado para filtrar o café (um exemplo bastante prático do uso da filtração). Ele funciona como uma peneira microscópica onde somente o líquido passa pelos seus minúsculos orifícios, acumulando a fase sólida dentro do filtro. “

A filtração se associa a Escorpião porque nesse processo o material sólido fica retido e o que for líquido pode passar, mesmo que modificado. Assim são os processos de Escorpião, que vive intensamente as coisas para modificar, transformar e purificar as emoções. O destaque aqui é para a necessidade de um meio líquido para se fazer a filtragem, pois só quando deixamos o emocional passar é possível fazer a separação entre o que é real, sólido, e o que não é. Sim, o resultado pode ser um estimulante café matinal! Claro que alguns vão ficar sem dormir à noite também...

   - União através da Solução (Câncer) – A Solução pode ser caracterizada por formar um sistema homogêneo (a olho nu e ao microscópio), impossível de se separar o disperso do dispersante por processos físicos. As soluções são compostas por moléculas ou íons comuns. Podem envolver sólidos, líquidos ou gases como dispersantes (chamados de solventes – existentes em maior quantidade na solução) e como dispersos (solutos). A solução também pode apresentar-se nesses três estados da matéria. É importante destacar que soluções gasosas são formadas apenas por solvente e soluto gasosos. Em farmácia, uma solução é uma forma farmacêutica líquida, caracterizada pela formação de um sistema onde todas as substâncias sólidas presentes na formulação devem estar totalmente dissolvidas em um veículo adequado. Portanto a solução deve ser líquida e transparente. ”

Câncer, né? Que é capaz de dissolver as separações das relações e transformar tudo em família. E adorei essa solução ideal, líquida e transparente: quando câncer consegue agir de maneira líquida e transparente realmente pode ser algo muito curador.

   - União através da Multiplicação (Aquário) – Multiplicação não é um processo químico, mas matemático: em aritmética é a “operação entre dois números inteiros que tem por fim somar um deles tantas vezes quantas forem as unidades do outro” e em álgebra é a “operação definida no corpo dos números reais e que generaliza a multiplicação entre inteiros. ” Só por isso já poderíamos chamar de um processo aquariano, o Ar Fixo zodiacal, portanto o que tem concentrado as possibilidades de abstração e cuja melhor representação é mesmo a matemática. Mas derivado dessa definição matemática temos ainda que em Biologia chamamos de multiplicação à reprodução assexual e em jurisprudência o processo de multiplicação é aquele que “acontece quando ao titular de um direito se unem outras pessoas que passam a exercer conjuntamente com ele suas faculdades jurídicas. ”: quer coisa mais aquariana do que reproduzir-se sem troca de fluidos e multiplicando direitos?

  - União através da Projeção (Peixes) – A Projeção é resultado direto das descobertas de refração da Luz de Sir Isaac Newton (1642/1727) que criou uma geometria usada pela química para criar a “ estereoquímica, que é um ramo da Química Orgânica que estuda as diversas possibilidades de estruturas em três dimensões das moléculas de carbono e suas consequências, isto é, as propriedades químicas resultantes. Uma parte importante da estereoquímica é a estereoisomeria, que ocorre quando dois ou mais compostos são isômeros (palavra que vem do grego isoméres = “partes iguais”) ou, mais corretamente nesse caso, estereoisômeros, que são compostos com a mesma fórmula molecular, mas que se diferenciam unicamente pelo arranjo tridimensional de seus substituintes. Isso quer dizer que esses compostos pertencem ao mesmo grupo funcional, possuem a mesma estrutura esqueletal (quando se considera a fórmula estrutural plana), além de a insaturação, heteroátomo ou substituinte (se houver) e grupo funcional estarem no mesmo carbono da cadeia. A única diferença é realmente o arranjo dos átomos no espaço, o que resulta em propriedades totalmente diferentes. Por isso, a importância de estudar as características das figuras geométricas que apresentam duas ou três dimensões. ” Ou seja, lembrando aquelas aulas de química do colegial, a projeção é uma maneira de representar em 2D fórmulas químicas que se diferenciam em 3D, como na imagem abaixo:


Em psicologia a projeção é uma ferramenta onde o ego coloca para fora – para outra pessoa, situação, sociedade, time de futebol – aquilo que ele não tem controle ou que ele não sabe como lidar. Para Freud se trata de coisas que o ego não consegue reconhecer em si por questões morais, como o homem que desqualifica as mulheres e acha que todo homem que se aproxima de sua filha é um idiota que quer “se aproveitar”, por exemplo. Para os junguianos trata-se de material arquetípico que o ego não tem como reconhecer em si, como as divindades ou a sombra, por exemplo. Hoje podemos dizer que os dois estão corretos e que esse é um mecanismo muito usual e interessante, além de muito importante na nossa autoanálise. Aquilo que nos incomoda no outro com certeza é algo que nos incomoda internamente.

Das características mais marcantes de Peixes, a empatia é das mais interessante, pois essa capacidade de se identificar com o Outro, de sentir o que o Outro precisa e se sacrificar por isso costuma ser a maior reclamação e a maior benção desse signo. Claro está que esse é um signo que propicia a projeção – positiva e negativa – dos outros de maneira muito clara. O processo pisciano pode ser traduzido, por tanto, através da projeção de um campo, um conhecimento, uma ideia, um sentimento, ou seja lá o que você queira trabalhar, em outro campo distinto, de modo a produzir um conhecimento mais preciso e uma representação em outro campo de consciência. 

Longa postagem... obrigada a você que conseguiu me acompanhar até aqui. Aos poucos vou organizando meus estudos e dividindo com vocês. Agora começam as correrias de fim de ano e de um ano marciano que nos surpreende a cada dia. 

Para lembrar: 2016 será um ano regido pelo Sol e desejo a vocês todos uma alegre redescoberta da própria integridade. Se 2015 foi emocionante e nos obrigou a ver nossas beligerâncias de perto, com essa regência marciana, o ano solar promete ser mais rico ainda para nos conhecermos melhor e descobrirmos quem realmente governa nossas vidas. Aproveitem!!!

quinta-feira, 17 de setembro de 2015

Leitura Para o Eixo Virgem - Peixes


“Depois de ensaboar, esfregar e enxaguar o cabelo, Auri mergulhou na interminável água negra de Tinidos, para se enxaguar pela última vez. Sob a superfície, algo roçou nela. Algo escorregadio e pesado encostou seu peso imóvel na perna dela. O que não a incomodou. Fosse o que fosse, estava em seu lugar, e ela também. As coisas eram exatamente como deviam ser.”


Esse post é para recomendar uma leitura enquanto o Sol ainda transita por Virgem: A Música do Silêncio (The Slow Regard of Silent Things), de Patrick Rothfuss, editado no Brasil em 2014 pela Editora Arqueiro. É um livro iniciático para o eixo Virgem-Peixes e, portanto, desvenda segredos de todas as suas combinações: Mercúrio na casa 12 e Netuno na casa 6, Virgem de casa 12 e Peixes de casa 6, Netuno em Virgem, Mercúrio em Peixes, etc.

O autor, Patrick Rothfuss, tem uma trilogia ainda não concluída chamada A Crônica do Matador do Rei (Ed. Sextante), que fala de um mago alquimista e da sua formação. Eu gostei muito dos dois primeiros livros já publicados, não só por que a história é muito boa, muito bem escrita e muito bem traduzida, mas também porque Ruthfuss realmente tem estudos de magia e alquimia e coloca esse conhecimento a serviço da trama, fazendo com que se possa fazer uma segunda leitura mais profunda enquanto se acompanha as peripécias do herói de caráter pra lá de duvidoso. 

Na escola de magia, onde o protagonista de Rothfuss vai parar para começar sua formação, ele encontra Auri, que vive nos subterrâneos da escola sem que ninguém perceba. Apenas o professor que ensina a descobrir o verdadeiro nome das coisas sabe dela, que um dia foi sua aluna mais brilhante e que ao se desenvolver teve um rompimento com o mundo externo e passou a viver nos subterrâneos, em vários sentidos. A Música do Silêncio é uma semana dessa encantadora personagem secundária da história do Matador do Rei em seu universo subterrâneo. 

Não é um livro de entrada fácil ou de saída confortável. Eu me senti em muitos momentos invadindo a intimidade de um ser absolutamente delicado, com mistérios que eu nunca poderei entender inteiramente. Essa foi uma das dicas para mim de que se trata desse eixo de transformação Peixes-Virgem. Mas com o desenrolar da história vai se entendendo muitos dos sentidos dado ao mundo e a si nesse eixo. 

Uma das características brilhantes desses signos é a compreensão mais profunda a respeito da humildade, e a busca por aperfeiçoar essa virtude. Claro que isso pode ser feito a serviço de uma ética distorcida, como no caso do Deputado Eduardo Cunha que serve à forças obscuras, ou a serviço do entendimento de uma harmonia e um sentido transcendente, que sabe ser a morte o final inevitável de todos, como no caso de Jorge Luís Borges: “Auri se sentia pequena. Não era a pequenez pela qual se esforçava todos os dias. Não a pequenez de uma árvore entre as árvores. De uma sombra no subterrâneo. E também não era a pequenez do corpo. Auri sabia não haver muito dela. (...) Mas não. Com o cabelo puxado para trás, e ainda por cima molhados, ela se sentia... menor. Comprida. Embaciada. Mais frágil. Lograda. Ilusória. Aflita. Seria puro desprazer sem a tira perfeita de linho. Não fosse isso, ela não se sentiria apenas como um pavio enrolado, mas completamente desfeita, derretida. Valia a pena fazer as coisas direito. ” (pg. 18/19)
Essa é uma boa chave que Auri dá ao longo do livro sobre a tal “perfeição” virginiana, tão diferente da perfeição libriana, pois não visa uma harmonia estética, mas um “encontrar o lugar certo”, um “fazer as coisas direito”: “Ainda assim, antes de sair, ajudou cada coisa a encontrar seu lugar apropriado. O cinto ficou na mesa de centro, é claro. A fivela deslocou-se e foi descansar ao lado do prato de resina. O osso aninhou-se numa proximidade quase indecente das drupas de azevinho. Já a engrenagem era um problema. Auri colocou-a na estante de livros, depois a mudou para a mesa de canto. Ela ficou encostada na parede, com a lacuna do dente perdido apontando para cima. Auri franziu a testa. Não era exatamente o lugar apropriado. Pegou a chave e a segurou diante da engrenagem. Preto e bronze. Ambas feitas para girar. Somadas tinha doze dentes.... Balançou a cabeça e deu um suspiro. Recolocou a chave no bolso e deixou a grande engrenagem na estante. Não era o lugar dela, mas era o melhor que Auri podia fazer por ora. ” (pg.28)

Apesar da fama de caótico de Peixes e de organizada de Virgem, esses dois signos buscam uma ordem de sentido que vai além das camisas pretas ao lado das brancas. Na verdade, faz muito mais sentido colocar a camisa do pai ao lado da camisa do avô, mesmo que as cores não combinem. Por isso a busca de Virgem por informação é tão distinta da busca geminiana, pois o Mercúrio virginiano está interessado em informações que possam ajudá-lo a descobrir o lugar “certo” das coisas. É por isso que virginianos e piscianos costumam se lembrar de histórias contadas a muito tempo atrás, mesmo que não lembrem do nome de nenhum dos personagens.

Aliás, uma das grandes questões da magia é exatamente descobrir o verdadeiro nome das coisas, e nossos nomes mudam conforme nossas vivencias, nossos lugares, nossas idades e nossas buscas, e descobrir esses nomes é a uma das vocações mutáveis desses signos. “Alguns locais tinham nomes. Alguns os mudavam, ou eram tímidos a respeito deles. Havia os que não tinham nome e isso era sempre triste. Uma coisa era ser reservado. Mas não ter nome? Que horror! Que solidão! ” (pg. 33) Esse horror e solidão é que fazem virginianos correrem atrás de informações a respeito da vida e de seus mistérios. Podem fazer a experiência e vocês verificarão a quantidade de virginianos psicólogos, astrólogos, tarólogos, e participantes de rodas de cura dos mais diversos segmentos procurando o nome das coisas. Por isso é tão difícil saber mais que um virginiano a respeito de algo a que ele se dedique, pois essa busca não é apenas por informação e cultura geral, como para o eixo Gêmeos-Sagitário, mas algo que impede a tristeza de não se ter nome tomar conta da vida. 

Essa busca pelo nome das coisas e por seu lugar correto, que faz com que Virgem consiga circular por esse mundo subterrâneo pisciano da maneira certa, é que faz esse ser parecer tão casto e comedido em sua aparência e comportamento, tão cheio de rituais sem sentido para quem olha de fora. Essa também é a fonte que alimenta a hiper crítica destrutiva de Virgem, que ela pode jogar para fora de várias maneiras ruins e tortas, mas que é mortal quando volta para si mesma, principalmente quando isso implica em abrir mão do próprio prazer. Vou destacar aqui uma boa passagem de como essa lógica funciona no relato de Auri: “Nesse instante, sua respiração ficou presa no peito. No fundo da gaveta, meticulosamente dobrados, estavam vários lençóis perfeitos, alvos e macios. Auri estendeu a mão para tocar um deles e se admirou ao ver como sua trama era fechada. Tão fina que seus dedos não conseguiam sentir os fios de linha. Era fresca e gostosa de tocar, como um amante recém-chegado do frio que viesse beijá-la. Auri deslizou a mão pela superfície. Que encanto seria dormir num lençol assim! Deitar sobre ele e sentir aquela doçura em toda sua pele nua! Ela estremeceu e fechou os dedos em torno das bordas dobradas do lençol. Mal percebendo o que fazia, Auri o tirou de seu lugar certo e o levou ao peito. Roçou os lábios na maciez do tecido. Havia outros lençóis embaixo desse. Um tesouro. Sem dúvida eram suficientes para um lugar como Carreta. Além disso, ela havia arrumado tantas coisas! Com certeza...
Fitou o lençol por um longo momento. E, quando seus olhos eram só suavidade e desejo, sua boca tornou-se firme e furiosa. Não. Não era esse o jeito das coisas. Ela não se deixava enganar. Sabia perfeitamente qual era o lugar daquele lençol. Fechou os olhos e o repôs na gaveta, sentindo a vergonha arder no peito. Às vezes ela era uma coisa cobiçosa. Querendo algo para si. Distorcendo a forma apropriada do mundo inteiro. Querendo mandar em tudo com o peso do seu desejo. ” (pg. 36/37)

Um herói de Touro ficaria com os lençóis sem pensar duas vezes, um de Capricórnio pensará duas vezes se isso representar algo importante em seus planos e não sentirá nada por fazer o que acha que tem que fazer. Nossa heroína Virgem olhará para dentro de si, e se houver algo fora do lugar “correto”, ela se sacrificará em nome disso, apesar da fama pisciana de sacrifício. O sacrifício será o mesmo nesse eixo. O resultado disso pode ser um olhar muito cruel para o mundo, já que as pessoas não vivem dentro dos mesmos padrões de correção.  Auri pode fazer isso por que é um personagem e vive dentro de um mundo subterrâneo. A vida com outros seres humanos é bem diferente.

Auri traz um caminhar virginiano por estares piscianos, na solidão e autonomia que simbolizam esses signos: “Auri ainda sorria quando se deitou em sua caminha perfeita. E, sim, a cama estava fria, e solitária também. Mas isso não tinha jeito. Auri sabia melhor que ninguém que valia a pena fazer as coisas direito. ” Esse é tanto o preço que se paga quanto a recompensa que se conquista por aqui.

Enfim, poderia ficar citando e destrinchando o livro todo, mas espero ter despertado a curiosidade de vocês a respeito de Auri e também desses seres mutáveis de modo a animá-los a fazer a leitura do livro e dos signos. Quem puder ler em inglês eu recomendo, pois Patrick Rothfuss faz vários jogos de palavras poéticos que valem a pena percorrer. Mas a tradução está boa também, não se preocupem. Talvez ajude ler primeiro as Crônicas do Matador do Rei, mas não necessariamente.

Uma última citação para falar algo que me ocorreu nessa leitura. Acho que no fundo o que Virgem quer é deixar de ser uma pessoa para se tornar um lugar como o Doze: “O Doze era um dos raros lugares mutáveis dos Subterrâneos. Era sábio o bastante para se conhecer, corajoso o bastante para ser ele mesmo e impetuoso o bastante para se modificar, ainda que, de algum modo, se mantivesse inteiramente correto. Era quase único nesse aspecto e, embora nem sempre fosse seguro ou bondoso, Auri não podia deixar de sentir afeição por ele. ” (pg. 15)

(PS. Essa vai para o Álvaro, que busca seu lugar através desse eixo e me mandou um lindo Zodíaco oriental que tem um Mercúrio de várias dimensões e começa por Aquário.)

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Pois o Sol está em Gêmeos

Para homenagear minha mãe, que sempre foi muuuuito geminiana, e estaria fazendo 87 anos! Ferindo o ré menor, malandro!


Ganhei de outra geminiana que adora ser geminiana e é amiga de anos, a Vânia Camargo querida. Adoro essas múltiplas pessoas!


quinta-feira, 30 de abril de 2015

Plutão Retrógrado em Capricórnio


“Inventar uma vida é a tarefa mais fascinante de um humano, exatamente pelo tanto de improvável e de absurdo que contem. É, como sabemos, nossa primeira ficção. E a empreendemos nus e com tão pouco.”

Eliane Brum


Plutão estará em movimento retrógrado até novembro, e isso significa uma ótima oportunidade para se pensar como as vivências externas e coletivas têm ativado processos e construções - ou desconstruções – internas. 

Com essa quadratura entre Urano em Aries e Plutão em Capricórnio que andamos vivendo nos últimos anos, uma pausa para se entender no meio de tudo isso é sempre bem vinda. Quando o mais lento dos planetas resolve dar uma olhada para traz saindo da sua expressão normal de tempo, podemos ver nossos movimentos dentro de um quadro mais amplo. A ideia é poder estar eliminando o que ainda pesa, limpando o que ainda fede e perceber as mudanças que já se operaram, para assim conseguir avaliar nosso processo de auto regeneração e programar, com ajuda do inconsciente, os próximos passos. Coisa pra gente grande, eu sei...

Essa briga entre mocinhos e bandidos que Urano em Aries vem instigando (capitalistas reacionários x comunistas corruptos é das mais óbvias) tem feito com que a sombra da estrutura capricorniana venha com mais força e a tendência a nos tornarmos fundamentalistas em busca do Poder fica evidente a cada passo, a cada disputa eleitoral, a cada PEC (proposta de emenda à constituição), a cada carteirada de juiz, a cada carro que estaciona sobre ciclovia ou em vaga de cadeirante.

Quando se percebe que olhar as necessidades de transformação internas trazem melhores frutos do que as tentativas de mudar o mundo externo, buscar as muitas coisas que ainda precisam ser feitas em si pode ser bem animado e uma ótima alternativa à depressão. Assim podemos aproveitar melhor também a força sugerida no 16º de Capricórnio pelos símbolos sabeus, onde Plutão está retroagindo: “quadras escolares repletas de jovens em roupas de ginática”. Pelo jeito aqui temos energia suficiente para reavivar vulcões e abalar o Himalaia...

O primeiro passo para isso é aceitar que não existem mocinhos e bandidos, que os capitalistas reacionários são corruptos e os comunistas corruptos são reacionários. E nós somos as duas coisas. Também. Assim como ser patriota é respeitar o povo que elegeu o partido comunista corrupto para o Executivo e os partidos capitalistas reacionários para o Legislativo. Também.  O que quero dizer é que não dá para eliminar o Inimigo, mas se você parar de xingar o Outro e olhá-lo nos olhos, ele pode ajudar você a se transformar no seu melhor potencial. E isso apenas seu Inimigo mais visceral poderá fazer. Com ajuda de Plutão então... Bom, com Plutão você não terá muitas outras opções...

Toda vez que o Outro está 100% errado e você está 100% certo, pode ter certeza de estar lidando com algum tipo de projeção. Isso quer dizer que você pegou uma parte sua que é mais aceita em algum nível (familiar, religioso, social, amoroso, etc.) e achou alguém ou alguma coisa para usar de cabide e pendurar aquilo que em você é oposto à imagem bacana que você tem de você mesmo. Winnicott fala da grande aventura que é a construção da nossa individualidade (individuo = individuus = indivisível).  Nascemos absolutamente dependentes de um adulto que cuide de nossas necessidades e que integre as nossas variadas experiências e percepções em um alguém coerente que poderemos chamar de eu. Uma das estratégias que usamos nessa construção é transformar as contradições e oposições que encontramos em um mesmo lugar em dois lugares diferentes. Assim imaginamos que existe uma mãe boa, que nos alimenta, nos troca, interage conosco e nos dá tudo que queremos e precisamos, e uma mãe má, que não nos alimenta quando temos fome e está fazendo outra coisa que não é cuidar de nós o tempo todo e por isso estamos em sofrimento. A ideia de que a mãe má e a boa são a mesma pessoa é avassaladora para esse ser em formação. Acho que seria mais ou menos como o Batman descobrir que o Coringa na verdade é seu pai e a Mulher Gato sua mãe, sendo eles quem pagam todas as contas do Bruce Wayne e da Bat aventura ao mesmo tempo em que o atormentam nas noites de Gotham City. Não faz sentido nem para o Kubrick. Então nós pequeninos amamos nossa mãe boa e combatemos a mãe má, até conseguirmos nos desenvolver o suficiente para encarar aquilo que foi chamado de Princípio da Realidade, ou seja, que essa história de mocinhos e bandidos, Vingadores vs Ultron é só uma distração de 2 horas em 3D no cinema perto de sua casa.

Os males da sociedade são nossos próprios males, mesmo que coloquemos a culpa nos políticos, no povo ou na mãe (sim, o secretário de segurança pública do RS disse que a culpa do aumento da criminalidade é das mulheres que trabalham fora). Com Plutão retrógrado em Capricórnio é possível entendermos a responsabilidade que temos em nossa construção de identidade, desde que consigamos incorporar nessa construção também os elementos destrutivos e distorcidos. Isso não é fácil, pois estamos acostumados a pensar apenas a partir de sistemas lineares, simples, e onde ainda não amadurecemos o suficiente vamos trabalhar com crenças generalizadoras e sentir a frustração como uma ameaça. Como diz o filósofo David Weinberger no livro To Big for Know: “Usar universais é uma tática simplificadora dentro de nossa estratégia mais abrangente para lidar com um mundo que é grande demais para ser conhecido, reduzindo o conhecimento àquilo que nosso cérebro e nossa tecnologia nos permitem lidar.” Acontece que atualmente e como adultos temos que trabalhar com sistemas complexos, onde o foco não está mais no sujeito ou no objeto, mas na relação, na conexão entre eles. Nem todas as conexões podem ser ótimas, ou seja, podem satisfazer às necessidades ou desejos ideais simultaneamente de modo a nos manter em equilíbrio e com um gasto mínimo de energia. Sistemas complexos só podem ser explicados e compreendidos através da desordem e da frustração.  

No símbolo de Plutão temos o divino isolado da matéria, e isso significa que esse planeta (planetoide, bi-planeta, ugabuga, ou seja lá como os astrônomos queiram chama-lo) traz o desolamento de não entendermos o significado maior de algo que parece muito ruim e muito frustrante, principalmente se quisermos buscar um sentido moral para o que acontece. A grande tentação que Plutão traz é acharmos que somos tão bacanas que se tivéssemos poder faríamos melhor, diferente, e traríamos a paz ao mundo, ou seja, faríamos o sistema entrar em equilíbrio. Principalmente se pudéssemos eliminar algumas dúzias de pessoas do mal. E segundo uma pesquisa que li falando de alguns assuntos polêmicos, eu eliminaria 93% da população. Ops... Pois então: Plutão foi avistado pela primeira vez em Câncer (signo oposto a Capricórnio) na mesma época em que ascendia o Nazismo na Alemanha e ele nos mostra sem anestesia que não adianta sermos bacaninhas na tentativa de negociar uma vida sem problemas com o Destino. As Moiras não aceitam barganhas e cobram caro esse tipo de ignorância.

É preciso abrir mão da ignorância que justificamos chamando de inocência para poder caminhar com Plutão até esses labirintos internos mais sombrios. Precisamos querer ver a verdade. Quando olhamos a nós mesmos com os olhos de Plutão podemos parecer bem mesquinhos e virulentos. Mas se você não olhar para isso com seriedade, essas mesquinharias e virulências vão contaminar o ambiente sem que você perceba, e aí você acaba nesse lugar impotente da vítima sem entender como. Você só estava brincando, né? Pois esse momento de Plutão retrógrado serve para pararmos de tentar esconder esse lado mais sombrio, nossas corrupções e desvios de verbas internos. Para isso teremos ajuda das nossas conexões e relacionamentos que denunciarão isso. Os falsos estados de equilíbrios, aqueles que se mantêm ao custo de não se olhar para as coisas como são ou de se fingir não estar em frustração não têm mais energia para manter-se, e então se rompem, muitas vezes de maneiras bem feias. Ou aparentemente feias, pois têm cara de caos, de desordem. Mas tenha certeza que só a partir disso algo novo vai poder ser criado. Vamos lá: respire e solte... Nós temos uma incrível necessidade de auto superação que aparece quando saímos desse lugar de vítima, e isso é tremendamente importante para podermos construir uma melhor civilização. Essa aproximação que podemos fazer nesse momento entre a nossa vida interior e a exterior são bem importantes. Muitas vezes é através da consciência que adquirimos nesses colapsos que podemos chegar naquele olhar no espelho que diz: “eu te odeio”. Se você conseguir sustentar esse olhar sem sair correndo ou sucumbir a ele, você então poderá passar para a fase criativa, que vem depois que conseguirmos perguntar ao espelho: “por quê?”. Aqui você vai conseguir caminhar por muitas das questões que realmente trazem sofrimento para você a partir de você mesmo. Não tenho como falar ou mostrar a mudança que pode causar na sua vida o encontro das justificativas que o sabotador interno cria para te deixar bem infeliz e assim se manter no controle.

O melhor lugar para se encontrar refúgio nesses momentos de colapso é sem dúvida no corpo físico. Como diz o povo que faz trabalhos corporais, nosso corpo somos nós no sentido mais básico, pois é nossa única realidade perceptível, e é muito importante que não o percebamos como oposto à nossa inteligência, espírito, sentimento, alma ou seja lá com que outra parte escolhemos colocar nossa identidade consciente “bacana”. O corpo sempre nos inclui e dá abrigo e por isso “ter consciência do próprio corpo é ter acesso ao ser inteiro... Pois corpo e espírito, psíquico e físico, até força e fraqueza, representam não a dualidade do ser, mas sua unidade” (Thérèse Bertherat e Carol Bernstein; O Corpo Tem Suas Razões). Que fique bem claro que aqui não estou falando sobre a obsessão de se moldar o corpo segundo um padrão estético de massa aprisionante e sim na consciência de que você e seu corpo, independente da forma que tenha, é você. Citando novamente Bertherat e Bernstein: “Saúde, bem estar, segurança, prazeres, deixamos tudo a cargo dos médicos, patrões, maridos, esposas, amantes, filhos. Confiamos a responsabilidade de nossa vida, de nosso corpo, aos outros, por vezes àqueles que não desejam essa responsabilidade e se sentem esmagados por ela; quase sempre àqueles que pertencem a Instituições cuja primeira finalidade é nos tranquilizar e, portanto, de nos reprimir”. Então, se você se sente em colapso, se seus relacionamento estão gerando frustrações, e você começa a entender que existem mais coisas em você do que você pensava – ou gostaria – respire, solte e vá para seu corpo, onde todas as suas contradições, emoções, crenças, valores, vivências e hábitos tem um lugar e podem mostrar o sistema complexo que você é. Se você escolher conhecer seu corpo em vez de combatê-lo, se as frustrações por ser um ser limitado puderem ser substituído por uma real curiosidade a respeito de si, se você se perguntar o que significa essa barriga, ou essa dor no joelho, ou essa vista cansada em vez de ficar tentando “corrigir” essas coisas, você vai ganhar em primeiro lugar autonomia, pois não precisa mais de algo externo para te dizer como você deve ser ou o que fazer consigo, já que seu corpo vai poder te falar isso. Mas principalmente você vai poder passar a usufruir o estar aqui, nesse momento, nesse corpo, que é só seu e de mais ninguém e que, mesmo com todas as contradições, traumas, dores e dificuldades, ainda dança, canta, sente e dá prazer. Esse livro, O Corpo Tem Suas Razões, é mesmo muito bom para pensar sobre isso: “quando renunciamos à autonomia, abdicamos de nossa soberania individual. Passamos a pertencer aos poderes, aos seres que nos recuperaram. Se reivindicamos tanto a liberdade é porque nos sentimos escravos; e os mais lúcidos reconhecem ser escravos-cúmplices. Mas como poderia ser de outro jeito, se não chegamos a ser donos nem de nossa primeira casa, da casa que é o corpo?”

Tenho percebido ao longo do tempo que esse voltar-se para conhecer e explorar o corpo é a melhor maneira de se tratar as crises ligadas aos transaturninos em geral e Plutão em especial. Acho que a principal razão disso é por que o corpo não mente, por mais enxertos e maquiagens que usemos. Mesmo se pensarmos nos transexuais, que nascem em um corpo de gênero oposto ao que são internamente, esse corpo também abriga quem essa pessoa é, e pode até se deixar moldar. A relação entre esse corpo e essa pessoa também irá criar uma identidade única. E se a relação não for amorosa, dificilmente poderá ter um caminho feliz. Também porque o corpo é o melhor professor para se trabalhar frustração. Diferente do relacionamento com uma outra pessoa, não podemos simplesmente ir embora quando nos frustramos ou nos assustamos conosco mesmos. Podemos deixar nossos corpos – de inúmeras maneiras – mas isso não irá eliminar ou resolver a questão, e geralmente cria mais problemas, que vão nos debilitando mais e mais até o corpo se desligar de vez. Plutão em especial costuma estar ligado a doenças bem debilitantes construídas com a negatividade interna não consciente. Cuidar do corpo nesse contexto não é acreditar na vida eterna do nosso físico ou na eterna juventude vendida como ideal, mas é conseguir estar bem consigo através do corpo. Isso vai integrá-lo em um todo coerente muito mais profundamente do que qualquer coisa externa que se encontre.

Como dizia Eduardo Galeano, de mui saudosa lembrança: “A Igreja diz: o corpo é uma culpa. A Ciência diz: o corpo é uma máquina. A publicidade diz: o corpo é um negócio. E o corpo diz: eu sou uma festa”.