terça-feira, 7 de janeiro de 2014

PROGRESSÕES I: PREVENDO O PASSADO

"Aquele singular comando
Não o entendo,
Agradeço ao que há de existir
A que devo obedecer, pois
Para que mais sou feito
Concordando ou discordando?”






(“That singular command
I do not understan
Bless what there is for being,
Which has to be obeyed, for
What else am I made for,
Agreeing or disagreeing?”)

Tradução livre de trecho do poema Precious Five de W.H. Auden

Sempre que vou falar de previsões fico com uma sensação de estar comentando a previsão do tempo (que me desculpe a analogia, minha querida Olivia Nunes), com frases do tipo: “no verão há grandes possibilidades de fazer calor e no inverno de fazer frio”. Acho que isso acontece porque se você conhece com um pouco de profundidade as quatro bases da astrologia – signos, planetas, casas e aspectos – as previsões são deduções lógicas que com um pouco de treino e bom senso podem ser feitas sem grandes problemas.

Outra coisa que ajuda nas previsões é tempo de vida, simplesmente porque se você já passou por algum processo será mais fácil entender mais profundamente como ele funciona, o que ajuda e o que atrapalha enquanto se está vivenciando algo. Um exemplo simples: se você tem mais de 30 anos já passou pelo retorno de Saturno, ou seja, já teve a visita desse titã por todas as áreas da sua vida, por todos os pontos e astros do seu mapa, e, portanto vai poder entender como os trânsitos e progressões de Saturno possibilitam realizar coisas com foco, seriedade e estruturação e também o porquê das coisas precisarem ser mais lentas para fazer isso direito. Claro que se poderá trabalhar com previsões e tudo mais de Saturno antes disso, mas depois dessas vivências você entenderá melhor o que significa “obstáculos e dificuldades” – palavras comuns de se encontrar quando se busca algo sobre Saturno – em seus processos. E isso ajuda.

Os Trânsitos são as primeiras formas de previsão que aprendemos e a que mais uso em consultas gerais para saber o que está acontecendo naquele momento específico da consulta. Vemos onde estão os astros agora e como eles estão se relacionando com o mapa da pessoa. Exemplificando com Saturno novamente. Nosso amigo titã está em Escorpião ficará por ali até dezembro de 2014. Se você tem alguma coisa nesse signo ele estará fazendo conjunção com sua(s) face(s) escorpiniana(s), ou seja, você vai precisar olhar com foco e seriedade os mergulhos em suas motivações internas e construir uma estrutura que permita a utilização adulta desse potencial. Saturno também estará agindo sobre aquilo que você tiver em Touro, signo oposto de Escorpião, mas de maneira mais tensa, pois estará fazendo oposição aos seus modos taurinos de viver. A maneira mais comum de vivermos oposições é através de relacionamentos, então se prestarmos atenção naquelas pessoas que parecem nos limitar e criar obstáculos para nossa expressão mais espontânea se entenderá o que está precisando de foco e estruturação para crescer nesse momento. E se temos algo nos outros signos fixos – Leão e Aquário - no mapa natal, Saturno estará trabalhando através de quadraturas com isso, ou seja, estará criando uma tensão interna que obriga a olharmos mais atentamente para esse elemento. Como tenho falado ao longo dos anos em trânsitos e esse é um assunto que sempre me trazem reflexões, vou me limitar a essa geral aqui.

Vamos falar um pouco mais sobre outro método de estar olhando para o futuro e saber se faz frio ou calor, e que pode ser bem útil se você resolver dar uma festa ao ar livre. Vamos entender o que são as Progressões.

As progressões “pensam” o mapa natal como algo que avança no tempo, criando situações astrológicas que mostram vivências através dos anos. Progredir significa avançar, mas não significa mudar aquilo que somos. Elas mostram situações que farão parte de nossa história, mas sem alterar os recursos que temos ou o trabalho de consciência que precisamos fazer dado pelo mapa natal. Mesmo que as progressões possam nos contar histórias sobre nosso futuro, eu as utilizo muitas vezes – muitas mesmo – para ouvir histórias do passado. Geralmente quando vivemos algo marcante na nossa vida temos progressões envolvidas, e fazer a análise simbólica astrológica pode nos ajudar a entender e incorporar o vivido de maneira muito rica, inclusive encontrando chaves que ajudam a mudar padrões que se repetem em nossas vidas e não entendemos o porquê. Essas marcas que vamos acumulando pelo caminho mostram onde criamos as bases de nossas respostas prontas, que tipos de crenças construímos e, portanto entendemos melhor os padrões repetitivos que vivemos e não conseguimos mudar por não entendermos o que são.

O conceito básico das progressões é derivada da máxima atribuída a Hermes Trismegisto, “o que está acima é igual ao que está abaixo”, que se transforma em “um dia acima é igual a um ano abaixo”. Temos três tipos básicos:

- Primárias (também chamadas direção), que podem ser zodiacais, onde se olha para os astros nos signos e seus aspectos, ou mundanas que consideram as posições nas esferas celestes sem considerar o zodíaco. Aqui se utiliza os movimentos reais dos astros que acontecem durante as horas que se seguem ao nascimento;

- Secundárias, que trabalham com o movimento da Terra em torno de seu eixo e um dia em torno do Sol corresponde a um ano, avançando um dia para cada ano e utilizando os movimentos reais nos dias que se seguem ao nascimento, como na Revolução Solar, por exemplo;

- Simbólica ou arco solar, onde se faz a progressão do mapa segundo a progressão do Sol, movimentando todo o conjunto do mapa igualmente pelo zodíaco.

Vamos começar entendendo um pouco mais sobre essa progressão simbólica, e assim você pode olhar o seu mapa e descobrir esses pontos importantes em sua história. Acredito que essa técnica de progressão é a melhor para se treinar o entendimento e a prática com progressões tanto por sua simplicidade quanto pela auto reflexão e auto conhecimento que proporciona. Ela também pode ser trabalhada com arredondamentos, já que trabalha com o simbolismo de uma época de vida e não com a precisão de dia/mês/ano de algo ocorrido. ‘Bora lá:

O Sol se movimenta pelo zodíaco na velocidade de 0°59’08’’ (lembrando: cada signo tem 30°, 1° tem 60’ e 1’ tem 60’’), que arredondamos para 1° por dia. Tomando o movimento solar diário como referência, olhamos para nosso mapa e vemos a quantos graus está cada um dos astros, transformamos esses graus em idades e refletimos sobre o que aconteceu naquela idade. Essa vai ser a idade em que o simbolismo ou arquétipo daquele astro foi condensado. Exemplo: Uma pessoa com a Lua a 12°37’ de Câncer, se parar para olhar o que estava acontecendo em sua vida familiar entre 12 e 13 anos, pode encontrar as vivências que teve e que deram a ela os padrões de família, lar, nutrição, vínculo afetivo e relacionamentos que ela repete ao longo da vida, e que provavelmente irão se renovar, inclusive externamente, a cada 12/13 anos.

É importante estar olhando não só para o astro em si, mas também para a casa em que ele se encontra e os aspectos feitos. Pegando esse nosso exemplo, suponhamos que essa Lua canceriana à 12°37’ está na casa 9: pode ser que o pai fosse militar e a família teve que mudar de cidade nessa época, ou então essa criança pode ter sido enviada para algum tipo de intercâmbio internacional, ou talvez ela tenha feito uma viagem bem marcante nessa idade que a fez cantar com Roberto Carlos “além do horizonte deve ter/algum lugar bonito pra viver em paazz ♪”. Mas vamos deixar essa história mais interessante: digamos que essa pessoa tem um Saturno a 12°50’ de Libra, na casa 12, fazendo uma quadratura (ângulo de 90°) com a Lua. Entre 12 e 13 anos ela teve a condensação da Lua, de Saturno e da quadratura. Isso sim é entrar na puberdade... Enfim, junto com essa experiência de mudança da Lua existe a experiência de isolamento de Saturno e de carência de nutrição dessa quadratura. Vamos continuar a história do pai militar para exemplificar: digamos, então, que aos 12 anos essa criança teve que mudar de cidade por conta do emprego do pai, e foi parar em uma cidadezinha que tem problemas em assimilar pessoas novas, e assim ela acaba sendo isolada na escola e na vizinhança, gerando um sentimento interno de solidão e a crença de ter que fazer muito esforço para ser aceita.

E atenção: esse exemplo é pura ficção. Qualquer semelhança com pessoas e fatos reais terá sido mera coincidência astrológica. Mas deu pra pegar o espírito da coisa?

Apesar das progressões se prestarem muito bem para truques de salão astrológicos, do tipo “com tantos anos aconteceu isso na sua vida” - o que é bem divertido e deixa os céticos confusos -, um trabalho profundo com as progressões simbólicas podem trazer grandes insights para os processos de autoconhecimento.  Para isso é necessário tempo e auto reflexão. Ter alguém para contar nossas histórias passadas ou escrever a respeito também ajuda muito nosso Mercúrio a construir uma compreensão significativa.

Apesar da resistência que tenho a receita de bolos astrológicos, aqui vai uma listinha de vivências ligadas aos astros para ajudar a memória:

Sol – consciência de si, objetivos de vida, descoberta do que se quer ser, criatividade, e muitas vezes experiências com o pai;
Lua – família, vínculos afetivos, auto idealização, exposição pública, conforto, nutrição, mãe,
Mercúrio – ensino/aprendizagem, comunicação, transporte, colegas de escola, irmãos, vizinhos;
Vênus – relacionamento amoroso, sedução, parcerias, prazer, dinheiro;
Marte – ação, agressividade, desejo e energia pessoal, liderança;

Esses são os astros pessoais e explorar suas progressões simbólicas nos mostra como e onde fomos construindo a noção de quem somos (e muitas vezes de quem “deveríamos” ser...). Isso nos leva à nossa identidade pessoal, e quando entendemos onde construímos crenças errôneas a respeito de nós mesmos que nos trazem dificuldades e/ou uma autoestima equivocada, podemos trabalhar para re-significar essas experiências. Vamos pegar a “vitima-exemplo” com Lua em Câncer enquadrada com Saturno em Libra: após essa época de condensação do seu arquétipo lunar ela vai perceber que quanto mais ela tentar se moldar para se enturmar, mais isolada ela irá se sentir, pois isso vai fazer com que ela se isole dela mesma. E aí vamos imaginar que a mãe leva esse filho ao astrólogo por não saber mais o que fazer com tanta infelicidade (a história é minha então vou puxar a sardinha para o meu lado, rs). E para termos um final feliz, digamos que essa pessoa entenda que precisa fazer um trabalho de introversão e não de extroversão para conseguir nutrir suas carências, e que precisa levar a sério seus vínculos afetivos, e que aquilo que tem para oferecer é precioso demais para que seja apreciado por qualquer um. Assim, ao longo dos anos, aquilo que se sentia como isolamento se transforma em oportunidade para encontrar-se consigo mesmo e os vínculos que foram sendo criados são agora baseados em respeito e responsabilidade, e essa Lua de casa 9 pode ir para qualquer lugar do mundo que ela sempre vai estar conectada e sendo nutrida pelos fortes laços que a liga àqueles que ama. Que lindo!! Não espere um caminho assim linear e iluminado em sua vida, ok? Geralmente os processos de transformação em nossas vidas levam muitos parágrafos para serem contados.

E já que falamos de Saturno, vamos dar uma olhada na dupla Júpiter & Saturno nas progressões.

Generalizar sempre traz armadilhas, mas vamos correr esse risco dizendo que o grau em que encontramos Júpiter e Saturno correspondem às idades em que formamos nossos valores sociais, onde Júpiter nos mostra como aprendemos a nos expandir através do ambiente externo à nossa família e Saturno como somos limitados pelo ambiente social. Isso pode nos ser mostrado através de alguém da família, como um tio que nos presenteia com um monte de exemplares de revistas de viagem e vivenciamos Júpiter, ou através de um avô autoritário que toda vez que visitamos fica nos dizendo como ele chama meninas de calça comprida ou meninos que brincam com meninas, e assim encorporamos Saturno. O aspecto que esses astros fazem com nossos planetas pessoais vai mostrar o como e onde mais detalhado da nossa experiência de condensação desses arquétipos sociais de expansão e limitação, vide nossa história ficcional. Quando Júpiter e Saturno estão em uma relação conflituosa com astros pessoais geralmente lembramo-nos de situações mais difíceis, Júpiter por exagero e Saturno por inadequação e insuficiência, e quando em relações mais harmônicas temos memórias de boas lições aprendidas.

Os transaturninos (Urano, Netuno e Plutão), também generalizando, mostram idades de grandes mudanças, em que o mundo vivido até em tão passa por algo que muda a maneira de encararmos a vida. Como já falei demais (para variar um pouco), vou deixa-los com essa imagem de mudanças para especularem sobre suas vidas.

Por último, uma explicação a respeito das limitações dessa análise progressiva do mapa: quando os astros estão muito no início do signo, isso significa uma condensação em idades muito “tenras”, ou seja, se você tem um Mercúrio a 0°30’ de Leão, por exemplo ficcional novamente, significa que a experiência que construiu esse arquétipo para você foi aos 6 meses de idade, e a menos que se seja um Buda renascido, vai ser bem difícil ter uma lembrança disso. Sempre existe a chance de ser algo que se tornou parte da crônica familiar, tipo seu irmãozinho mais velho querido querendo te enforcar, mas nem sempre a memória da família pode ser acessada assim. Isso também significa que a cada 6 meses esse padrão é retomado, por tanto pode ser algo que você já tenha tão incorporado que nem perceba, ou então algo que se já tem previsto no seu calendário anual, tipo ter uma briga com o tal irmãozinho querido que você encontra quando vai visitar seus pais duas vezes ao ano. 

Outro problema desse estudo é quando o astro está no outro extremo do signo, mais perto do seu final, tipo um Marte a 29° de Áries. Isso não quer dizer que você só irá experimentar seu Marte - ou seja, sua agressividade e capacidade para ação pessoal - aos 29 anos, mas que nessa idade você vivenciou (ou vivenciará) esse Marte de maneira a criar um padrão consciente mais definido. Na literatura a respeito se diz que quando um astro está a mais que 10 graus de um signo, dividimos a idade por 2 para encontrar a vivencia condensadora desse simbolismo: esse Marte a 29° de Aries teria sua experiência matriz entre 14 e 15 anos, então, e se dividimos essa idade por 2 encontramos uma primeira vivencia significativa lá pelos 7 anos. Nunca encontrei nenhuma explicação sobre o porque de se dividir a idade por 2 (e não por 3 ou 5 ou 30), mas como na maioria das vezes tem funcionado, continuamos a usar, certo? A única coisa que me ocorre quando penso no porque disso é que como o máximo que se pode chegar nesse trabalho é uma idade de 30 anos, metade disso dá uma idade suficientemente consciente. Seja como for, a experiência marciana dos 29 anos vai dar mais material para ser trabalhado, e poderá ser usada para re-significar mais conscientemente a experiência dos 14/15 anos e dos 7 anos.

Tem muita coisa que ainda quero falar sobre Progressão Simbólica, mas aqui já tem material suficiente para se passar um tempo examinando o mapa e a memória. Vale a pena pesquisar com família e amigos de infância/adolescência para recuperar essas vivências e também perceber como esse tipo de vivência se repete ao longo da vida. Mas vamos voltar a falar disso.