sábado, 15 de janeiro de 2011

Mercúrio na Sinastria - ou o que é diálogo

" Instintivamente, (as pessoas) supõem que sua própria constituição psíquica seja generalizada, e que todas as pessoas são essencialmente semelhantes às outras, isto é, a elas próprias... como se a sua própria psique fosse uma espécie de psique-matriz que servisse para todas as situações, e as autorizassem a supor que a sua própria situação fosse a regra geral. As pessoas ficam profundamente espantadas, ou mesmo horrorizadas, quando essa regra geral não se aplica – quando descobrem que outra pessoa é, na verdade, muito diferente delas. De forma geral, não consideram essas diferenças psíquicas, de modo nenhum curiosas e muito menos atraentes, mas, sim, falhas desagradáveis difíceis de tolerar, ou defeitos insuportáveis que devem ser condenados”.
C.G.Jung – Tipos Psicológicos

Aproveitando que o ano de 2011 será um ano mercuriano, vamos falar um pouco de Mercúrio nas sinastrias, na comparação de mapas. Quem sabe podemos aproveitar o ano para despertar a curiosidade e a alegria de encontrar os “diferentes” de nossa vida.

Mercúrio é um ponto importante no nosso mapa natal, apesar de sua rapidez e transitoriedade. Como nossa mente. Madame Blavatsky dizia, na Doutrina Secreta, que “Mercúrio e o Sol são um”, mostrando a unidade entre a essência, representada pelo Sol, e a função que nos permite conhecer e transmitir a essência, Mercúrio. Quando entendemos esse pequeno planeta no nosso mapa, entendemos melhor como funciona nossa mente, o que possibilita tanto aproveitar mais esse recurso valioso quanto aprender o que fazer quando nossa cabeça não para de ficar dando voltas vazias sem chegar a lugar nenhum. O objetivo de Mercúrio não é chegar a algum lugar. Mercúrio serve para recolher informações, buscar novas explicações, enriquecer nossa maneira de observar o mundo, entender aquilo que é diferente de nós e em nós e trocar tudo isso com os outros. Assim sendo, claro que é importante verificar como é o relacionamento mercurial quando a proposta é a nos entendermos com algum tipo de Outro. Muitas vezes conseguimos resolver os conflitos encontrados nos relacionamentos exatamente porque os Mercúrios estão em uma relação harmônica e entendemos a lógica com a qual o Outro funciona. Assim, podemos contornar e mesmo dissolver os nós que aparecem pelo meio da relação e que nos afasta d@ parceir@. Mas é também a terrível mania humana – e parece que todas as culturas de todos os tempos possuem essa característica em algum grau – de acreditar que a minha maneira de ver e entender a mim e ao mundo é a melhor e mais evoluída maneira de se fazer isso, que traz a maioria das Guerras e Discórdias entre pessoas e povos.

Como sempre, voltamos à base dos elementos e modalidades para entender como funciona a dinâmica astrológica. Aos estudantes e diletantes astrológicos sugiro que estudem, entendam e revejam sempre isso. Eu sempre encontro novas maneiras de estudar essa parte. (Falando nisso, vocês assistiram "O Último Mestre do Ar"? Bacana. Uma técnica diferente de arte marcial para cada elemento. E o desenho Avathar também é legal.)

Quando os Mercúrios de duas pessoas estão no mesmo elemento – Fogo, Ar, Água ou Terra – elas irão pensar e buscar informação da mesma maneira. Fogo vai querer informações inspiradas e entenderá as coisas de maneira mais intuitiva que racionalmente. Água vai buscar a lógica emocional que está por baixo da racionalidade aparente, mais obvia, e fazer um julgamento afetivo a respeito. Já Ar buscará a lógica abstrata daquilo que se apresenta, entendendo como uma idéia se combina e encaixa com outra, numa construção que possibilita a generalização dos raciocínios. Terra, por sua vez, entenderá como as idéias funcionam no mundo concreto e prático, baseado principalmente naquilo que seus sentidos físicos dizem. É fácil perceber, então, que se duas pessoas possuem Mercúrio no mesmo elemento, vai ficar mais fácil estar explicando o que se está vivendo e como se entende aquilo que é vivido, tanto no plano pessoal quanto no relacionamento, de uma maneira que o outro possa entender e pensar junto.

É bem interessante perceber como os elementos complementares atuam através de Mercúrio. Quando encontramos alguém com Mercúrio no signo oposto do nosso, essa pessoa provavelmente poderá nos mostrar outro lado do nosso raciocínio, o que é sempre enriquecedor. Claro que quando nos apoiamos demais na nossa maneira de raciocinar e pensar, alguém nos dizer que não conseguimos ver tuuuuuudo, pode ser um golpe no ego, principalmente se estamos muito entusiasmados com alguma idéia particular. E você vai sentir isso como provocação se o seu real objetivo não for um diálogo, mas a imposição da sua idéia a respeito de algo.

Fogo se complementa com Ar, e o Mercúrio em Fogo gosta de criar idéias originais. O Mercúrio em Ar vai pegar a idéia de Fogo e generalizá-la, o que a despersonaliza para colocá-la em um contexto mais coletivo. O Mercúrio em Fogo não vai achar isso divertido, mas pode ampliar seu horizonte, com um pouco de boa vontade. Já o Mercúrio em Ar vai estar envolto com as teorias e ideologias que norteiam o “bom pensar”, e o Mercúrio em Fogo vai pegar aquelas teorias e dar personalidade e ação a essas idéias todas, intuindo caminhos. Isso pode fazer com que toda a harmonia ideal dos raciocínios de Ar se veja desarrumada por tantas cores fortes e movimento, mas entender como esses ideais podem ser aproveitados de maneira mais pessoal traz muitas vantagens para o raciocínio aéreo, indo além da teoria.

Água e Terra também vão criar pensamentos complementares. O Mercúrio em Água vai estar ligado ao subtexto do que vê e conhece para poder entendê-lo, sendo muito comum que a compreensão venha através de imagens e sons. Terra vai pegar todas essas idéias emocionalmente carregadas e buscar uma aplicação prática para isso, de modo a poder utilizá-la para entender melhor a maneira que o mundo funciona. Claro que as imagens muito delirantes e as mensagens de outras dimensões podem se sentir um tanto esvaziadas quando precisam ser colocadas em prática, mas também vai ajudar a perceber o que é apenas brincadeira mercuriana e o que realmente pode ser aprofundado. O pragmatismo de um Mercúrio em Terra muitas vezes pode ser dissolvido quando o Mercúrio em Água capta a raiva, ternura, inveja ou insegurança emocional, por exemplo, que há por baixo de pensamentos e idéias aparentemente tão isentos de emoções e tão “realistas”. Isso ajuda muito o Mercúrio terráqueo a não levar seus pensamentos tão ao pé da letra e também a perceber que as idéias que se apresentam no consciente têm uma ligação direta com o mundo inconsciente. Aliás, essa é uma função bem importante de Mercúrio: trazer e levar mensagens do inconsciente para o consciente e “vice-versa-ao-contrário”.

Se a complementaridade é razoavelmente fácil de detectar e apreciar com um pouco de boa vontade – no mapa astral aparece como oposição, ou signo oposto -, as quadraturas e quincuncios costumam ser bem mais irritantes e frustrantes. Isso acontece em relação a qualquer planeta ou ângulo do mapa, mas com Mercúrio costuma nos fazer entrar em discussões bem difíceis, algumas vezes de modo compulsivo. Eles são reconhecíveis no mapa por uma distância de 90° e 150°. Terra e Água fazem esses tipos de aspectos com Ar e Fogo, e vice-versa. O negócio é mais ou menos assim: você faz uma piada maldosa sobre uma notícia no jornal e o outro começa a falar de política a sério; ou você tenta marcar um cinema e o outro pergunta se você está querendo compromisso; ou você quer falar sobre compromisso e o outro fala do jogo du coríntia no domingo; ou se planeja uma viagem juntos e um quer ir conhecer as maravilhas exóticas da Índia e o outro sonha com a maravilhosa civilidade da água de torneira da Holanda. Acordar no dia seguinte da balada ao lado daquele gostoso que você descobre ter perdido o cérebro ou da frágil Barbie que se levanta sendo professora titular da Sorbonne e falando em aramaico, pode ser um tanto chocante, mas depois acaba se transformando em uma história divertida para compartilhar com amigos – também conhecidos como “aqueles que realmente me entendem”. Mas se a coisa já passou dessa fase, é bom prestar mais atenção no que se escuta e no que se fala com uma relação conflituosa desse tipo entre os Mercúrios. Principalmente se a relação não for romântica, no sentido popular, mas se tratar de um pai/mãe com filho/filha, ou com sócios de negócios ou com algum chefe ou subordinado no trabalho.

Um Mercúrio em Ar privilegia o mundo das idéias em sua compreensão do mundo e de si, e estabelece as diferenças entre “isto” e “aquilo”, pesando uma coisa contra a outra, classificando informações e possibilitando uma avaliação impessoal das coisas e situações. O Mercúrio em Água estará interessado em todo o espectro do mundo do sentimento, desde suas partes mais claras até as profundezas mais escuras, já que no sentimento não há distinções baseadas em princípios “certos” ou “errados”, isto ou aquilo. Em Fogo, Mercúrio se encanta com os infinitos caminhos que a mente pode seguir, e estará sempre construindo sua compreensão exterior a partir daquilo que sua mente experimenta interiormente. Quando em Terra, Mercúrio estará curioso a respeito daquilo que existe no mundo concreto, principalmente sobre aquilo que chega até seu corpo físico desde fora, e costuma também fazer seus raciocínios mais apurados através de fatos que lhe acontecem. Se cairmos em uma discussão para saber qual o raciocínio “melhor” ou mais “evoluído”, tudo irá travar e não chegamos a lugar nenhum. Esse é um antigo e eficiente truque de Mercúrio para perdermos ao outro e a nós também. Quando você entrar em alguma discussão que parece não ter fim, ou em uma mesma conversa que fica se repetindo e repetindo – muitas vezes consigo mesmo – talvez seja bom lembrar que estamos em um sistema comandado por uma estrela de quinta grandeza, na periferia de uma galáxia menor. Não dá para saber tudo. Simplesmente não dá. Muitas vezes, mesmo prestando muita atenção, nós realmente não conseguimos entender o que o outro quer nos comunicar. Se aceitarmos isso, podemos compreender que há momentos em que o outro também não vai entender nada do que estamos falando, mesmo prestando atenção naquilo que dizemos. Esse desconcertante momento de reconhecimento da própria ignorância pode ser o começo de uma verdadeira e mais profunda compreensão, de si, do outro, do mundo, da vida. Muitos amigos músicos que compõem me disseram que a música começa no silêncio. Talvez aqui seja a mesma coisa.