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quinta-feira, 30 de abril de 2015

Plutão Retrógrado em Capricórnio


“Inventar uma vida é a tarefa mais fascinante de um humano, exatamente pelo tanto de improvável e de absurdo que contem. É, como sabemos, nossa primeira ficção. E a empreendemos nus e com tão pouco.”

Eliane Brum


Plutão estará em movimento retrógrado até novembro, e isso significa uma ótima oportunidade para se pensar como as vivências externas e coletivas têm ativado processos e construções - ou desconstruções – internas. 

Com essa quadratura entre Urano em Aries e Plutão em Capricórnio que andamos vivendo nos últimos anos, uma pausa para se entender no meio de tudo isso é sempre bem vinda. Quando o mais lento dos planetas resolve dar uma olhada para traz saindo da sua expressão normal de tempo, podemos ver nossos movimentos dentro de um quadro mais amplo. A ideia é poder estar eliminando o que ainda pesa, limpando o que ainda fede e perceber as mudanças que já se operaram, para assim conseguir avaliar nosso processo de auto regeneração e programar, com ajuda do inconsciente, os próximos passos. Coisa pra gente grande, eu sei...

Essa briga entre mocinhos e bandidos que Urano em Aries vem instigando (capitalistas reacionários x comunistas corruptos é das mais óbvias) tem feito com que a sombra da estrutura capricorniana venha com mais força e a tendência a nos tornarmos fundamentalistas em busca do Poder fica evidente a cada passo, a cada disputa eleitoral, a cada PEC (proposta de emenda à constituição), a cada carteirada de juiz, a cada carro que estaciona sobre ciclovia ou em vaga de cadeirante.

Quando se percebe que olhar as necessidades de transformação internas trazem melhores frutos do que as tentativas de mudar o mundo externo, buscar as muitas coisas que ainda precisam ser feitas em si pode ser bem animado e uma ótima alternativa à depressão. Assim podemos aproveitar melhor também a força sugerida no 16º de Capricórnio pelos símbolos sabeus, onde Plutão está retroagindo: “quadras escolares repletas de jovens em roupas de ginática”. Pelo jeito aqui temos energia suficiente para reavivar vulcões e abalar o Himalaia...

O primeiro passo para isso é aceitar que não existem mocinhos e bandidos, que os capitalistas reacionários são corruptos e os comunistas corruptos são reacionários. E nós somos as duas coisas. Também. Assim como ser patriota é respeitar o povo que elegeu o partido comunista corrupto para o Executivo e os partidos capitalistas reacionários para o Legislativo. Também.  O que quero dizer é que não dá para eliminar o Inimigo, mas se você parar de xingar o Outro e olhá-lo nos olhos, ele pode ajudar você a se transformar no seu melhor potencial. E isso apenas seu Inimigo mais visceral poderá fazer. Com ajuda de Plutão então... Bom, com Plutão você não terá muitas outras opções...

Toda vez que o Outro está 100% errado e você está 100% certo, pode ter certeza de estar lidando com algum tipo de projeção. Isso quer dizer que você pegou uma parte sua que é mais aceita em algum nível (familiar, religioso, social, amoroso, etc.) e achou alguém ou alguma coisa para usar de cabide e pendurar aquilo que em você é oposto à imagem bacana que você tem de você mesmo. Winnicott fala da grande aventura que é a construção da nossa individualidade (individuo = individuus = indivisível).  Nascemos absolutamente dependentes de um adulto que cuide de nossas necessidades e que integre as nossas variadas experiências e percepções em um alguém coerente que poderemos chamar de eu. Uma das estratégias que usamos nessa construção é transformar as contradições e oposições que encontramos em um mesmo lugar em dois lugares diferentes. Assim imaginamos que existe uma mãe boa, que nos alimenta, nos troca, interage conosco e nos dá tudo que queremos e precisamos, e uma mãe má, que não nos alimenta quando temos fome e está fazendo outra coisa que não é cuidar de nós o tempo todo e por isso estamos em sofrimento. A ideia de que a mãe má e a boa são a mesma pessoa é avassaladora para esse ser em formação. Acho que seria mais ou menos como o Batman descobrir que o Coringa na verdade é seu pai e a Mulher Gato sua mãe, sendo eles quem pagam todas as contas do Bruce Wayne e da Bat aventura ao mesmo tempo em que o atormentam nas noites de Gotham City. Não faz sentido nem para o Kubrick. Então nós pequeninos amamos nossa mãe boa e combatemos a mãe má, até conseguirmos nos desenvolver o suficiente para encarar aquilo que foi chamado de Princípio da Realidade, ou seja, que essa história de mocinhos e bandidos, Vingadores vs Ultron é só uma distração de 2 horas em 3D no cinema perto de sua casa.

Os males da sociedade são nossos próprios males, mesmo que coloquemos a culpa nos políticos, no povo ou na mãe (sim, o secretário de segurança pública do RS disse que a culpa do aumento da criminalidade é das mulheres que trabalham fora). Com Plutão retrógrado em Capricórnio é possível entendermos a responsabilidade que temos em nossa construção de identidade, desde que consigamos incorporar nessa construção também os elementos destrutivos e distorcidos. Isso não é fácil, pois estamos acostumados a pensar apenas a partir de sistemas lineares, simples, e onde ainda não amadurecemos o suficiente vamos trabalhar com crenças generalizadoras e sentir a frustração como uma ameaça. Como diz o filósofo David Weinberger no livro To Big for Know: “Usar universais é uma tática simplificadora dentro de nossa estratégia mais abrangente para lidar com um mundo que é grande demais para ser conhecido, reduzindo o conhecimento àquilo que nosso cérebro e nossa tecnologia nos permitem lidar.” Acontece que atualmente e como adultos temos que trabalhar com sistemas complexos, onde o foco não está mais no sujeito ou no objeto, mas na relação, na conexão entre eles. Nem todas as conexões podem ser ótimas, ou seja, podem satisfazer às necessidades ou desejos ideais simultaneamente de modo a nos manter em equilíbrio e com um gasto mínimo de energia. Sistemas complexos só podem ser explicados e compreendidos através da desordem e da frustração.  

No símbolo de Plutão temos o divino isolado da matéria, e isso significa que esse planeta (planetoide, bi-planeta, ugabuga, ou seja lá como os astrônomos queiram chama-lo) traz o desolamento de não entendermos o significado maior de algo que parece muito ruim e muito frustrante, principalmente se quisermos buscar um sentido moral para o que acontece. A grande tentação que Plutão traz é acharmos que somos tão bacanas que se tivéssemos poder faríamos melhor, diferente, e traríamos a paz ao mundo, ou seja, faríamos o sistema entrar em equilíbrio. Principalmente se pudéssemos eliminar algumas dúzias de pessoas do mal. E segundo uma pesquisa que li falando de alguns assuntos polêmicos, eu eliminaria 93% da população. Ops... Pois então: Plutão foi avistado pela primeira vez em Câncer (signo oposto a Capricórnio) na mesma época em que ascendia o Nazismo na Alemanha e ele nos mostra sem anestesia que não adianta sermos bacaninhas na tentativa de negociar uma vida sem problemas com o Destino. As Moiras não aceitam barganhas e cobram caro esse tipo de ignorância.

É preciso abrir mão da ignorância que justificamos chamando de inocência para poder caminhar com Plutão até esses labirintos internos mais sombrios. Precisamos querer ver a verdade. Quando olhamos a nós mesmos com os olhos de Plutão podemos parecer bem mesquinhos e virulentos. Mas se você não olhar para isso com seriedade, essas mesquinharias e virulências vão contaminar o ambiente sem que você perceba, e aí você acaba nesse lugar impotente da vítima sem entender como. Você só estava brincando, né? Pois esse momento de Plutão retrógrado serve para pararmos de tentar esconder esse lado mais sombrio, nossas corrupções e desvios de verbas internos. Para isso teremos ajuda das nossas conexões e relacionamentos que denunciarão isso. Os falsos estados de equilíbrios, aqueles que se mantêm ao custo de não se olhar para as coisas como são ou de se fingir não estar em frustração não têm mais energia para manter-se, e então se rompem, muitas vezes de maneiras bem feias. Ou aparentemente feias, pois têm cara de caos, de desordem. Mas tenha certeza que só a partir disso algo novo vai poder ser criado. Vamos lá: respire e solte... Nós temos uma incrível necessidade de auto superação que aparece quando saímos desse lugar de vítima, e isso é tremendamente importante para podermos construir uma melhor civilização. Essa aproximação que podemos fazer nesse momento entre a nossa vida interior e a exterior são bem importantes. Muitas vezes é através da consciência que adquirimos nesses colapsos que podemos chegar naquele olhar no espelho que diz: “eu te odeio”. Se você conseguir sustentar esse olhar sem sair correndo ou sucumbir a ele, você então poderá passar para a fase criativa, que vem depois que conseguirmos perguntar ao espelho: “por quê?”. Aqui você vai conseguir caminhar por muitas das questões que realmente trazem sofrimento para você a partir de você mesmo. Não tenho como falar ou mostrar a mudança que pode causar na sua vida o encontro das justificativas que o sabotador interno cria para te deixar bem infeliz e assim se manter no controle.

O melhor lugar para se encontrar refúgio nesses momentos de colapso é sem dúvida no corpo físico. Como diz o povo que faz trabalhos corporais, nosso corpo somos nós no sentido mais básico, pois é nossa única realidade perceptível, e é muito importante que não o percebamos como oposto à nossa inteligência, espírito, sentimento, alma ou seja lá com que outra parte escolhemos colocar nossa identidade consciente “bacana”. O corpo sempre nos inclui e dá abrigo e por isso “ter consciência do próprio corpo é ter acesso ao ser inteiro... Pois corpo e espírito, psíquico e físico, até força e fraqueza, representam não a dualidade do ser, mas sua unidade” (Thérèse Bertherat e Carol Bernstein; O Corpo Tem Suas Razões). Que fique bem claro que aqui não estou falando sobre a obsessão de se moldar o corpo segundo um padrão estético de massa aprisionante e sim na consciência de que você e seu corpo, independente da forma que tenha, é você. Citando novamente Bertherat e Bernstein: “Saúde, bem estar, segurança, prazeres, deixamos tudo a cargo dos médicos, patrões, maridos, esposas, amantes, filhos. Confiamos a responsabilidade de nossa vida, de nosso corpo, aos outros, por vezes àqueles que não desejam essa responsabilidade e se sentem esmagados por ela; quase sempre àqueles que pertencem a Instituições cuja primeira finalidade é nos tranquilizar e, portanto, de nos reprimir”. Então, se você se sente em colapso, se seus relacionamento estão gerando frustrações, e você começa a entender que existem mais coisas em você do que você pensava – ou gostaria – respire, solte e vá para seu corpo, onde todas as suas contradições, emoções, crenças, valores, vivências e hábitos tem um lugar e podem mostrar o sistema complexo que você é. Se você escolher conhecer seu corpo em vez de combatê-lo, se as frustrações por ser um ser limitado puderem ser substituído por uma real curiosidade a respeito de si, se você se perguntar o que significa essa barriga, ou essa dor no joelho, ou essa vista cansada em vez de ficar tentando “corrigir” essas coisas, você vai ganhar em primeiro lugar autonomia, pois não precisa mais de algo externo para te dizer como você deve ser ou o que fazer consigo, já que seu corpo vai poder te falar isso. Mas principalmente você vai poder passar a usufruir o estar aqui, nesse momento, nesse corpo, que é só seu e de mais ninguém e que, mesmo com todas as contradições, traumas, dores e dificuldades, ainda dança, canta, sente e dá prazer. Esse livro, O Corpo Tem Suas Razões, é mesmo muito bom para pensar sobre isso: “quando renunciamos à autonomia, abdicamos de nossa soberania individual. Passamos a pertencer aos poderes, aos seres que nos recuperaram. Se reivindicamos tanto a liberdade é porque nos sentimos escravos; e os mais lúcidos reconhecem ser escravos-cúmplices. Mas como poderia ser de outro jeito, se não chegamos a ser donos nem de nossa primeira casa, da casa que é o corpo?”

Tenho percebido ao longo do tempo que esse voltar-se para conhecer e explorar o corpo é a melhor maneira de se tratar as crises ligadas aos transaturninos em geral e Plutão em especial. Acho que a principal razão disso é por que o corpo não mente, por mais enxertos e maquiagens que usemos. Mesmo se pensarmos nos transexuais, que nascem em um corpo de gênero oposto ao que são internamente, esse corpo também abriga quem essa pessoa é, e pode até se deixar moldar. A relação entre esse corpo e essa pessoa também irá criar uma identidade única. E se a relação não for amorosa, dificilmente poderá ter um caminho feliz. Também porque o corpo é o melhor professor para se trabalhar frustração. Diferente do relacionamento com uma outra pessoa, não podemos simplesmente ir embora quando nos frustramos ou nos assustamos conosco mesmos. Podemos deixar nossos corpos – de inúmeras maneiras – mas isso não irá eliminar ou resolver a questão, e geralmente cria mais problemas, que vão nos debilitando mais e mais até o corpo se desligar de vez. Plutão em especial costuma estar ligado a doenças bem debilitantes construídas com a negatividade interna não consciente. Cuidar do corpo nesse contexto não é acreditar na vida eterna do nosso físico ou na eterna juventude vendida como ideal, mas é conseguir estar bem consigo através do corpo. Isso vai integrá-lo em um todo coerente muito mais profundamente do que qualquer coisa externa que se encontre.

Como dizia Eduardo Galeano, de mui saudosa lembrança: “A Igreja diz: o corpo é uma culpa. A Ciência diz: o corpo é uma máquina. A publicidade diz: o corpo é um negócio. E o corpo diz: eu sou uma festa”.


domingo, 1 de fevereiro de 2015

Quem Tem Medo de Mercúrio Retrógrado?

A maior riqueza do homem
é a sua incompletude.
Nesse ponto sou abastado.
Palavras que me aceitam como sou - eu não aceito.
Não aguento ser apenas um sujeito que abre portas,
que puxa válvulas, que olha o relógio,
que compra pão às 6 horas da tarde,
que vai lá fora, que aponta lápis,
que vê a uva etc. etc. 
Perdoai
Mas eu preciso ser Outros.

Eu penso renovar o homem usando borboletas.”
Manoel de Barros


Continuo ouvindo histórias de terror quando se fala sobre Mercúrio Retrógrado, por isso vamos tentar olhar para isso de maneira um pouco mais ampla.

Duas coisas me levaram a estar aqui, buscando esse entendimento com vocês: a fala de um astrólogo bem bacana – ou seja, que pensa astrologia parecido comigo, hehe - chamado Tom Kaypacha Lesher (www.newparadigmastrology.com), que a amiga querida Tatiana Schreiner me apresentou, e umas gravuras Etruscas que caíram na minha mão e me encantaram, como essa de abertura da postagem. Etruscos era como os gregos denominavam o povo que habitava em cidades-estado a região que hoje seria a Toscana, entre os rios Arno e Tigre na Itália, em torno de 1200 e 700 a.C.

A maior parte das informações que recebemos dos povos da Antiguidade (período que vai da descoberta da escrita, aproximadamente 4000 a.C, até a queda do Império Romano, cerca de 476 d.C) vieram até nós através dos Gregos, que se transformaram nos relatores oficiais daquilo que “valia a pena ser conhecido”. Por isso sabemos bastante sobre os Egípcios e tão pouco sobre a Gália e a cultura Celta, por exemplo, pois os gregos viviam trocando figurinhas com os Egípcios, mas achavam que os Celtas eram uns bárbaros ignorantes.  Mesmo a astrologia, que tem referencias pré-históricas, chegou até nós através dos filtros gregos elaborados por Ptolomeu (90-167) – que era egípcio de nascimento e vivia  em Alexandria, também no Egito – através do seu incrível Tetrabiblos. Uma das dificuldades que isso nos traz é que muitas coisas que os gregos desqualificavam, são importantes hoje em dia para se compreender o mundo e as pessoas. Sem desonrar toda a importância do pensamento grego para a construção do mundo que conhecemos, uma das dificuldades mais problemáticas que herdamos da cultura greco-romana que nos constitui - em minha opinião - é uma incrível misoginia (do grego miseó = ódio, gyné = mulher). Quando se estuda mitologia greco-romana nos deparamos constantemente com o tema do estupro “necessário” para que mulheres se entreguem a homens e filhos possam ser gerados; as deusas mais louvadas são as que não exercem sua sexualidade – daí a maneira como a castidade feminina foi assimilada pelos cristãos -, além da substituição de elementos femininos, yin, como a força das Águas ou da Morte, por deuses masculinos, mesmo que as práticas cotidianas e iniciáticas ligadas a esses temas sejam exercidas por mulheres. Afrodite/Vênus parece ser a única que conseguiu conservar um pouco da força original, mesmo tendo sido rapidamente casada para mantê-la dentro de uma estrutura social aceitável. É sempre bom nos lembramos de que ela é fruto dos genitais de Urano que fertilizaram o Oceano (ou já podemos dizer a Oceano?). Essa é a razão pela qual eu utilizo a mitologia de outros povos para entender e explicar alguns elementos astrológicos e acredito que isso tem ajudado a ampliar minha compreensão e também a de meus alunos. Muitas vezes é através da leitura de mitos bem distantes dos Greco-romanos que aparece aquela luzinha de compreensão para meu Mercúrio. Então, e Mercúrio retrógrado com tudo isso?

Hermes-Mercúrio é o Macunaíma (o herói sem nenhum caráter de Mario de Andrade, que se você ainda não conhece vai adorar conhecer) da mitologia grego-romana. Já escrevi sobre o mito e as aventuras mercurianas, então só vou recordar aqui que Mercúrio é um deus amoral sem ser imoral, que ajuda e atrapalha heróis com a mesma desenvoltura, assim como exerce funções femininas e masculinas com o mesmo charme. Da união desse deus dúbio com a poderosa Afrodite-Vênus nasce Hermafrodito, o herói que não precisa definir seu gênero, pois contem os dois. Nas imagens dos Alquimistas Mercúrio algumas vezes aparece vestido de mulher e se casando com Marte-Ares (Enxofre), como nessa aqui de G. van Vreeswyk, alquimista holandês do século 17:



Podemos entender hoje em dia essas características mercurianas que simbolizam o pensamento humano de maneira muito mais científica, através das pesquisas feitas com o nosso cérebro, que mostram como temos realmente dois tipos de raciocínio, um baseado no lado esquerdo e outro no lado direito desse órgão, que funcionam simultaneamente. O lado esquerdo é caracterizado pelo pensamento abstrato, que utiliza uma lógica de causa e efeito, que olha as partes de algo e tenta juntá-las de uma maneira que faça sentido racional em uma esfera de tempo, e assim aprendemos e construímos a comunicação verbal e nosso aprendizado linguístico, a compreensão de regras e estruturas, etc. O hemisfério direito busca a compreensão do todo trabalhando com várias informações ao mesmo tempo e é por onde aprendemos a linguagem não verbal e construímos uma compreensão espacial/corporal. O bom funcionamento do nosso cérebro depende da boa comunicação entre os dois hemisférios, assim como o bom funcionamento da nossa sociedade e da nossa pessoa depende da boa comunicação entre homens e mulheres, entre yang e yin, masculino e feminino. Há quem diga que um lado é mais desenvolvido em homens e o outro mais em mulheres, mas hoje sabemos que nosso cérebro é treinado pela formação que recebemos, então na época que meninos ganhavam bolas e meninas bonecas tínhamos um lado mais treinado em homens e outro lado em mulheres. A carência de um lado significa dificuldades para o outro lado e comunicação exagerada entre os dois lados cria sobrecarga no corpo caloso, o feixe de nervos que liga um hemisfério ao outro, gerando convulsões tipo epiléticas.  Já vi Amor sendo definido dessa maneira: respeito entre duas partes que colaboram com seu melhor... Enfim, especula-se que nosso cérebro processa em torno de 400 bilhões de bits de informação por segundo, sendo que aproveitamos cerca de 2 mil para nossa consciência cotidiana do mundo. Apesar de não se conseguir ainda a confirmação exata desses números, parece que a proporção entre quantidade de informação inconsciente e consciente está correta. Por isso cada vez se tem melhores resultados ao se trabalhar com as ideias de sistemas complexos, fenômenos emergentes, campos mórficos e morfogenéticos, onde observamos e usamos os resultados a partir de processos muito difíceis de captar conscientemente, individualmente.

Pois então. A cada quatro meses mais ou menos Mercúrio parece se movimentar para traz no céu durante uns 20 dias, e chamamos isso de movimento retrógrado. Já falei sobre isso em termos práticos em outra postagem.



No cotidiano nossa mente está muito mais consciente das nossas atividades externas, e aí fazemos a lista de supermercado, xingamos o apressadinho que nos deu uma cortada no trânsito, conferimos o extrato do banco e lemos um texto técnico para o trabalho enquanto planejamos a viagem de férias, as contas a serem pagas, quando vai entrar o dinheiro que vou receber por aquele trabalho, em quantas prestações eu poderia comprar aquela moto, as dúvidas a respeito daquela resposta do chefe ser um elogio ou uma crítica, quando será que vou encontrar  novamente aquele homem interessante que conversei na padaria e onde foi parar o boné preferido do filho.  Os pensamentos são fenômenos emergentes, como qualquer sistema complexo, e Mercúrio, com sua capacidade de caminhar por todos os reinos e encontrar caminhos e atalhos através da Matéria, da Alma e do Espírito representa isso.

Acontece que quando Mercúrio está retrógrado as atividades externas ganham mais informações do que aquelas que precisamos para cumprir nossas tarefas. Aí nos lembramos do gosto do bolo de festa da mãe enquanto falamos com um cliente, surgem milhares de possibilidades mais interessantes do que aquele texto chato que precisamos ler, músicas estranhas que nos remetem a outros tempos surgem na cabeça (principalmente aquela que só lembramos uma frase horrível), sabemos exatamente o que queremos dizer, mas sem encontrar as palavras, lembramos de levar cangaprotetorguardasolcadeirachapeu para a praia e na hora de pagar o sorvete percebemos que esquecemos a carteira em cima da mesa. Isso significa em primeiro lugar que os tempos de Mercúrio retrógrado são para verificar como vai o seu humor e sua capacidade de rir de si mesmo. Tem muita gente que sofre durante os tempos de Mercúrio Retrógrado porque têm uma autoimagem idealizada de pessoa séria e focada, e aí quando vivenciam essas coisas precisam sair da zona de conforto e vivenciar um descontrole bem incômodo. Esses são períodos em que precisamos treinar pedir ajuda, o que também é muito incômodo para a maioria das pessoas, mas que é a melhor estratégia que encontrei: se você tem que assinar algum documento, peça para alguém que você confia dar uma lida antes; se você precisa apresentar algo para seu chefe ou para a escola, treine antes com alguém que sabe do que você está falando e escute as críticas e recomendações. Se der para adiar atividades que precisam de uma linha reta para serem resolvidas, bacana, mas você não vai adiar sua viagem de férias com a família, por exemplo, porque Mercúrio estará aparentemente andando para trás! Vai haver mais riscos de você perder a mala, principalmente se você não queria mesmo passar as férias na casa da sogra mas não conseguiu achar nenhum argumento suficientemente lógicos para mudar os planos para os Lençóis Maranhenses, além do “eu quero tanto”. Muitas vezes a lógica interna é diferente da lógica externa e isso fica evidente nessas épocas. Mercúrio retrógrado deixa em maior evidência a lógica interna, por isso tanta confusão.

Essas razões que a própria razão desconhece são atribuídas normalmente ao feminino, e, aliás, muitas vezes para chamar a mulherada fraca. Ou de louca. Ou de bruxa. Por isso ficamos tão receosos de confiar nessa outra racionalidade. Bom para ouvir música, visitar museu, dançar, ler novela e conversar com o inconsciente. Por que isso tem que ser assim horripilante, feito filme B de terror? Um pouco de cuidado e bom humor pode fazer com que esse seja um tempo bem frutífero. O seu trabalho exige foco mental? Você está em época de provas? Você tem um monte de coisas sérias e importantes para fazer e não tem tempo para fazer essas coisas? Então meditação por 20 minutos, 3 vezes ao dia, pode ajudar você a relaxar. Ou reservar algum tempo do seu dia e/ou da sua semana para fazer essas coisas para que elas não precisem invadir sua vida devidamente controlada. Realmente seria interessante que você começasse a viver esses dias de Mercúrio retrógrado como uma oportunidade de saber como você está com você mesmo, e não como algo que vai atrapalhar sua vida.

E é por isso que as gravuras Etruscas me fizeram pensar na alegria do Mercúrio Retrógrado. Os Romanos arrasaram a maioria das construções etruscas, que parece que eram tão avançadas como a dos próprios romanos, e só sobraram os túmulos. Aquilo que sabemos sobre esse povo vem, então, da relação que eles tinham com a morte, e ali encontramos homens e mulheres unidos e felizes, sexo abundante e muita gente fazendo música e dançando. Uma das funções de Mercúrio é de psicopompo (psyque = alma + pompo = guia), um guia da alma humana através dos caminhos até o reino dos mortos e de volta ao reino dos vivos. Podendo ele caminhar pelas polaridades da vida – céu e terra, nascer e morrer, dia e noite –, existe nesse planeta o potencial de trazer para a consciência uma compreensão muito mais abrangente e profunda do que a que estamos acostumados cotidianamente, quando Mercúrio se encontra retrógrado. Aqui pode estar a solução para o problema insolúvel, a verdade pressentida, a intenção não revelada. Seja no mapa natal ou no trânsito, vale a pena deixar a alma acompanhar Mercúrio em sua jornada, pois pode ser que ele te mostre algo muito melhor do que seu medo permitiria enxergar. 



Obs. Esse texto foi pensado, elaborado e publicado durante o movimento retrógrado de Mercúrio como um desafio para mim mesma. Escolhi um período em que, mesmo retrógrado, ele estaria em trígono com o Mercúrio do meu Mapa Natal, que afinal, né?.. Não foi o texto mais fluido para trabalhar, mas também não foi nada muito diferente do meu normal, e eu não tenho Mercúrio Retrógrado no mapa. Uma coisa bem interessante que aconteceu, foi encontrar muito mais informações não verbais. Eu tive que me controlar para não colocá-las todas aqui. Elas serão bastante úteis para as aulas desse ano...

domingo, 7 de abril de 2013

Planetas Retrógrados



"O livre-arbítrio é a capacidade de fazer com alegria aquilo que devo fazer"

C. G. Jung




Resolvi falar sobre os Planetas Retrógrados porque tenho encontrado gente justificando seus problemas na vida por conta desse aparente “movimento para trás”, que faz parte da nossa visão do Cosmos. Sim, é verdade que os retrógrados dão mais trabalho para serem conscientemente assimilados, mas o que significa isso na prática? Eu saio do pressuposto que ser quem se é não pode ser um problema, e o mapa ajuda a se entender como a pessoa funciona. Não pretendo levar em conta as questões ligadas a Karma ou outras vidas ou outras dimensões, pois essa não é a minha praia. Como a grande maioria das pessoas possui ao menos um planeta retrógrado no mapa, o que me interessa é entender como as pessoas usam essa ferramenta para se expressar.

A dificuldade central dos planetas retrógrados é que eles trabalham fora da nossa linha de tempo linear passado-presente-futuro, e por isso as áreas em que atuam precisam ser encaradas também diferentemente. De maneira bem simplificada, quando aqui da Terra vemos um planeta andar para trás, projetamos sua ação no futuro e agimos de acordo com essa projeção, e, portanto, teremos que rever os acontecimentos dessa área para poder seguir e continuar agindo. Na prática isso significa que se ligarmos o automático nas áreas em que temos planetas retrógrados teremos dificuldades ao ver que muito do que cremos e a maneira como agimos não se encaixam naquilo que estamos vivendo no presente, o que nos faz repetir situações bem desconfortáveis e duvidosas. A natureza desses desconfortos e confusões irá variar muito conforme as características do planeta, do signo e da casa em que o movimento retrógrado acontece.

Vamos pegar um exemplo cheio de dificuldades: um Marte Retrógrado em Touro e na casa XII. Marte, por sua natureza expansiva, vai se sentir muito bem na sua projeção de futuro, pois esse é um planeta que busca ação e no futuro tudo pode acontecer, mas tanto Touro quanto a casa XII têm uma natureza mais passiva, segurando essas ações e fazendo com que elas não sejam tão imediatas quanto Marte geralmente é. Em um segundo momento, quando esse Marte colocar a mão na massa e agir, ele terá ideias muito férteis a respeito do que quer, pois de alguma maneira já viveu aquilo, mas depois terá que recuar um tanto para analisar as consequências de seus atos. Um tanto cansativo, eu reconheço, mas conforme a pessoa se habitua ao próprio modo de agir marciano, ela será capaz de atuar conscientemente e aproveitar para realmente conseguir o que quer. Em um exemplo como esse a pessoa vai se sentir mais confortável na hora de realmente agir, confirmando suas visões de futuro, mas ela tem que passar pelo desconforto de ver o futuro e não agir anterior e pela revisão de suas ações posteriormente. Os problemas, dores e dificuldades aparecem quando se busca estar apenas no lugar de conforto, onde esse retrógrado cria situações mais harmoniosas com a casa e o signo em que se encontra. Por isso, ao analisar um planeta retrógrado, precisamos entender em qual fase a pessoa costuma parar, para então entender todo o processo e buscar maneiras de se restabelecer o fluxo.

Os planetas que costumam nos dar mais trabalho são os pessoais, Mercúrio, Vênus e Marte, já que eles estão diretamente ligados à identidade que criamos. Júpiter já é um planeta que nos ajuda a antever os benefícios que teremos com a expansão de nossos horizontes, e os problemas com seu movimento retrógrado são os costumeiros excessos e otimismo exagerado. Saturno retrógrado também não traz tantos problemas, já que ele por si mesmo nos faz andar com mais cuidado e consciência. Os transaturninos, como são geracionais e nos mostram movimentos coletivos, quando estão em movimentos retrógrados trazem a possibilidade de a pessoa entender como ações coletivas atuam em sua vida pessoal, o que, idealmente, pode ajudar muito na hora de escolher um caminho ideológico, espiritual ou filosófico. Com Urano, Netuno e/ou Plutão retrógrados, a pessoa terá que ver como o coletivo atua em seu ser antes de aderir mais profundamente. Esse é um ótimo antídoto para as cegueiras coletivas.

Vamos cuidar, então, dos planetas pessoais retrógrados.

Mercúrio atua na maneira de nos comunicarmos, na forma como transmitimos aos outros aquilo que vivemos e compreendemos interiormente e também como captamos as ideias que o mundo nos apresenta. Esse planeta nos traz a gama de curiosidades que temos tanto a nosso próprio respeito quanto a respeito do mundo, o que pode variar desde a roupa que a pop star usou em seu show, às maravilhas da cura pelo limão, até as palavras em sânscrito de algum mantra aprendido ou as delícias de se decifrar um filósofo mais erudito. Quando Mercúrio está retrógrado, a comunicação pode ser bem confusa e o aprendizado intelectual sofrer alguns contratempos, pois é bem complicado para a mente se manter apenas no presente e estabelecer uma relação de reciprocidade com os que estão ao seu redor. Isso não quer dizer um mau rendimento escolar, mas sim uma necessidade de resolver as questões não compreendidas antes de passar para frente, o que pode criar alguns conflitos com professores ou colegas que acham que o conhecimento dado foi suficiente. Ao mesmo tempo esse Mercúrio trará muitos insights que dificilmente poderão ser explicados através de uma lógica linear ou aparente, o que pode ser bem interessante para o portador desse planeta retrógrado, mas não ajuda na hora que se tenta explicar algo para outra pessoa. Martin Shulman comenta que existem muitos talentos musicais com Mercúrio Retrógrado, e isso, provavelmente, conecta as dificuldades da comunicação verbal com a busca de uma maneira mais sutil de comunicação. Eu, particularmente, encontro muitos bailarinos contemporâneos com esse Mercúrio. Dificuldades de comunicação isola a pessoa, e é comum encontrarmos nervosismo e irritação quando se tem que lidar com isso. É como viajar para Praga, na Republica Checa, sozinho e sabendo se comunicar apenas em português, por exemplo. A pessoa vai ter que desenvolver sua capacidade de fazer mímica e buscar palavras em comum nas duas línguas, além de outras palavras de outros idiomas que conheça se quiser sobreviver em um país onde se fala Checo. Se ficar por ali tempo suficiente vai conseguir aprender a nova língua e se comunicar de maneira satisfatória. Ou pode se tornar um ótimo mímico.

Enquanto Mercúrio tem como motivação a curiosidade, a força motriz de Vênus é o prazer, seja ele estético, afetivo ou físico. É através desse planeta que harmonizamos o que vivemos internamente como valores pessoais e aquilo que encontramos exteriormente no mundo. Onde encontramos com Vênus somos naturalmente receptivos ao mundo externo para aproveitar o que há de bom na vida, e por isso temos a capacidade de transformar aquilo que encontramos em algo mais belo, e, portanto, mais prazeroso. Acredito que seja fácil imaginar uma pessoa se decepcionando com o prazer e alegria que consegue da vida futura levando em conta apenas uma satisfação do passado vivida em situações diferentes. História didática exemplar: era uma vez uma menina de 4 anos que um dia resolveu se arrumar toda com as roupas da mãe para esperar o pai. Naquele dia seu pai chegou especialmente bem humorado e com tempo e vendo sua pequena filha divertidamente fantasiada, com a cumplicidade da mãe, entra na brincadeira e fala como ela está linda e lhe dá um grande abraço e um beijo cheio de ternura. A pequena criatura pega esse momento de alegria familiar e a projeta no futuro, e então, muuuuuuuuuuuitos anos depois, toda vez que essa sua alegria e prazer não acontecem em seus relacionamentos amorosos adultos ela se sente não amada, ou rejeitada, ou então rejeitará o parceiro dando demasiada ênfase àquilo que ele não é, ou seja, seu pai em um momento particularmente amoroso e tranquilo. Esse momento mágico da infância nunca mais será repetido, mesmo porque quando somos pequenos nossos pais são tudo que existe de importante na vida e quando crescemos o mundo fica – ou deveria ficar – bem maior. A capacidade de nossos valores e prazeres se ampliarem conforme crescemos é um dos atributos principais que temos que cultivar em nossa Vênus para seguir pela vida com alegria em estar vivo. Isso não significa descartar valores antigos, mas aperfeiçoá-los e ampliá-los conforme nossas necessidades e consciência se transformam, agradecendo os momentos felizes do passado e seguindo em busca de novos prazeres. Qualquer tensão que Vênus sofra (que pode ser desde uma conjunção com Saturno ou Urano até uma quadratura ou oposição) costumam trazer problemas para que esse processo seja feito dessa maneira “bonitinha”. A particularidade da Vênus retrógrada é a insistência que ela costuma apresentar em pré-programar, muitas vezes inconscientemente, seus relacionamentos para que eles se encaixem nos padrões passados. A dor que isso causa não vêm necessariamente da busca por um ideal irrealizável de amor ou beleza, mas pela falta de noção real a respeito do que traria prazer e alegria para sua vida atual. É comum pessoas com Vênus retrógradas manterem casamentos longos, mas insatisfatórios. A insatisfação muitas vezes não é por conta de não gostarem da parceria, mas por não saberem o que fazer com aquilo que não encaixa em seu passado.

Marte é o planeta da energia vital direcionada para fora, que nos impulsiona para o mundo na busca por expressão e satisfação pessoal. Qualquer coisa que limite os movimentos marcianos costuma ser sentido como algo que impede a pessoa de conquistar aquilo que quer, e quando retrógrado isso aparece como uma inadequação temporal, ou seja a pessoa age imaginando um futuro e depois percebe que se precipitou e que precisa aprender a ajustar a quantidade de energia que disponibiliza para conseguir o que quer. Muitas vezes a pessoa também não se sente com forças para romper situações que o aborrecem, e quando questionada do porque em geral traz uma série de razões sem sentido. Esse é um planeta com energia intuitiva e instintiva, portanto não é nossa face mais dada a reflexões. O sentimento de que suas realizações pessoais não são satisfatórias parece acompanhar esse Marte retrógrado. Por isso quem tem que agir através dele vai precisar aprender a andar em zig zag e descobrir que isso não tem nada a ver com seu entorno e com as pessoas que se acredite terem que contribuir com suas ações. O Marte retrógrado vai realmente deslumbrar grandes ações futuras, mas toda vez que agir nesse sentido terá que voltar atrás para avaliar os efeitos de sua ação antes de dar outro passo para poder adequar-se à sua realidade atual. Quando a projeção no futuro se mostrar exagerada, a sensação de rejeição vai obrigar a um recuo, e é importante que a pessoa pense nisso como uma necessidade de reavaliação, e assim possa experimentar a possibilidade de estar no presente para criar esse futuro desejado em vez de culpar as pessoas ou o mundo por sua insatisfação. Independente do posicionamento ou condição de nosso Marte, uma das coisas mais importantes no processo de amadurecimento e crescimento de nossa personalidade consiste exatamente no aprendizado que temos que fazer de focar nossa energia marciana para aquilo que realmente queremos, no sentido mais profundo desse querer. Quem tem um Marte retrógrado aprende a fazer isso mais cedo. 

segunda-feira, 4 de março de 2013

Urano e a Construção do Indivíduo Moderno


“Somos um olho por meio do qual o mundo exterior se faz visível, mas um olho que não pode ver-se a si mesmo quando vê”

Rüdiger Safranski



Tive uma série de problemas no mundo virtual que andaram me impedindo de escrever aqui. Aproveitei para estudar um pouco de filosofia do século 18 para ver se conseguia entender umas coisas que Urano estava me fazendo pensar, agora que ele transita por Áries e começa um novo ciclo zodiacal. Com o blog se reabrindo de novo pra mim (obrigada Rui Alão!!), volto o compartilhar o que andei pensando com vocês.

Durante o século 16 o mundo começa a se transformar em algo completamente diferente daquilo que era até então. Copérnico deixa para nós, após sua morte em 1543, “Das Revoluções das Esferas Terrestres”, tirando a Terra do centro do Universo e a colocando na terceira órbita em volta do Sol. Lutero se rebela contra as indulgências da Igreja Católica e publica sua tradução da Bíblia para o alemão vulgar em 1534, tirando da Igreja o monopólio sobre as interpretações da vontade de Deus e da essência da Vida.

Com o Ser Humano mandado para um canto do Universo e os guardiões da metafísica destituídos de seu poder, a teologia deixa de ser a base necessária para o conhecimento, e se inicia uma busca empírica pelos saberes do mundo. A ciência que nasce no século 17 tem como principal expoente Galileu Galilei, que junta observação experimental com descrição teórica de fenômenos, criando leis naturais explicadas através da matemática e confirmadas através de suas observações concretas. Deve ter sido ele que criou o ditado "contra fatos não há discussão".

Esse novo lugar no Universo modifica nosso olhar para a vida e para nós mesmos. A busca pelo conhecimento com base empírica e não mais teológica  nos faz desenvolver a capacidade de encontrar outras respostas para as “questões finais” filosóficas (imortalidade da alma, liberdade/livre arbítrio, existência de Deus, princípio e fim do mundo), que sustentam a religião e o Homem no Mundo, sem que precisemos recorrer à metafísica. O nome que damos a isso é Racionalidade. Nasce assim a biologia, a mineralogia, paleontologia e também a antropologia, a ciência política, a economia, pois a ideia de que “a natureza tende à organização”, deixa de ser uma máxima que nos obriga a acreditar em Deus e passa a ser uma porta para se entender a Natureza e o Mundo em que vivemos.

Quando Rene Descartes (1596-1650) aparece no século 17, há uma busca por motivos racionais para a existência de Deus. Ele sai do pressuposto de que assim como existe o mundo, Deus tem que existir. Na verdade o que Descartes acaba demonstrando é que  Deus é uma ficção necessária a partir da autorreflexão da razão. Sua famosa frase “cogito ergo sun” (penso logo existo), quer demonstrar que o exercício da razão é a maneira que Deus tem de se expressar no Ser Humano: “Não sou eu que me aproprio de Deus através do poder da minha razão, mas bem o contrário: é Deus que toma posse de mim enquanto exerço minha razão”. Essa tentativa de usar a racionalidade para conhecer a Deus ainda sai do pressuposto de que o mundo é um reflexo de Deus, mas abre as portas para os Empiristas, que buscam conhecer o mundo através da atividade racional e da confiança na percepção sensível.

Quem se contrapõe a essa ficção de Descartes é Jean Jacques Rousseau (1712-1778), que inverte a proposição cartesiana ao afirma não ser possível o pensamento antes da existência: “primeiro preciso existir para depois poder pensar”. Rousseau combate toda ideia de um Deus revelado – o que enfurece católicos e protestantes – e o coloca no coração dos Seres Humanos: “quantos homens entre mim e Deus!”, costumava dizer. Isso significa que o conhecimento só é possível a partir da experiência interna que se tem de um mundo externo. Ele percebe que as várias maneiras de se experimentar o mundo através dos sentidos precisa de um princípio organizador que é chamado de Eu. O “visto” e o “tocado”, por exemplo, se converteriam em 2 objetos diferentes por meio apenas da percepção do mundo exterior. Somente um “Eu” é capaz de realizar a síntese e coloca-los em conexão como sendo um único objeto. Portanto é a identidade do Eu que garante a unidade dos objetos exteriores a si. Assim nasce a ideia de um Ego psicologicamente equipado para  experimentar e conhecer a vida humana.

Sem um “Eu”, não há um “Outro”, e, assim a percepção do Eu é que produz o “Ser” individualizado. A Percepção e o Conhecimento passando a ser um fenômeno psicológico de autoconsciência faz do Eu o responsável de compor e instalar o mundo através do prazer, da intensidade, da alegria de viver, da tristeza, etc. O Ser Humano deixa de ser expectador para se tornar o diretor da vida: “o ser humano (...) tornou-se capaz de recolher todas as riquezas que haviam sido anteriormente espalhadas pelo céu”. Ao se entender que os antigos tesouros da metafísica eram obras das mãos humanas, ficaram todos muito animados com esse poder, mas logo essas riquezas perderam sua magia e se mostraram incapazes de cumprir suas promessas. Nasce daí o temor da História construída por nós mesmos.

Urano, o sétimo planeta a partir do Sol e o mais massivo de nosso sistema, foi avistado pela primeira vez em maio de 1781, rompendo as fronteiras do Universo que até então eram guardadas por Saturno. Esse foi o primeiro planeta avistado por um telescópio, portanto fruto dessa nova mentalidade que surge no século 18 que tenta conhecer o mundo de maneira racional e não mais teológica, aperfeiçoando seu olhar sobre a natureza e o Ser Humano. Esse é um tempo de grandes avanços de nossa capacidade técnica. Queremos ver mais longe, ouvir mais acuradamente, expandir nossos sentidos físicos para conhecer o Mundo e o Humano. Essa é a consciência que Urano nos traz. Saturno nos mostra as regras e dogmas sociais, que temos que conhecer e aprender a usar se quisermos ultrapassá-los, e Urano atua no sentido de mostrar que essas regras e dogmas são obras humanas, e, portanto, podem ser construídas e desconstruídas a partir da busca por valores e conceitos que nos tornem mais livres enquanto humanos. Kant aparece nesse contexto em busca do “a priori” do pensamento humano para entender o como e o que se pode conhecer. 

Immanuel Kant (1724-1804) mostra que conhecemos através da intuição e utilizando o espaço e o tempo concreto. Ele reconstrói minuciosamente nossa maneira de pensar o mundo através de 12 categorias do entendimento. O nosso entendimento é a faculdade que temos de usar conceitos que nos possibilitam fazer juízos. Os Juízos são divididos por ele em 4 formas e 3 tipos (Relação:  a mesa é de madeira; Hipótese:  se colocar água sobre a mesa ela se mancha; Disjuntiva: se é verdade que isso é uma mesa então não é um fogão). O que ele quer demonstrar é que o conhecimento humano tem como aprioridade a apercepção, ou seja, a capacidade de perceber e interpretar os estímulos sensoriais. Esse conhecimento só pode ser feito através de um “sujeito” que percebe o mundo antes de se defrontar com a experiência concreta material, e através disso constrói representações de si e do mundo que permitem o entendimento de sua existência concreta. 

Uma das consequências dessa compreensão que me interessa destacar aqui é a de que o nosso pensamento deixa de nos ligar ao transcendente, pois não estão além da experiência, mas são transcendentes em si, pois existe antes da experiência, criando conceitos onde as nossas experiências pessoais fazem sentido: “se as submetemos a um exame cuidadoso perante nosso olhar intelectual, transcenderemos a experiência em direção às condições da possibilidade da experiência (construiremos conceitos), ou seja, (em sentido) horizontal, mas não verticalmente”. Resumindo: “não existe nenhum caminho que conduza do Transcendental ao Transcendente”. Isso significa que nossa razão humana não tem como conhecer a “Deus”, o “Absoluto”, a “Causa Primeira”, ou seja lá como você queira chamar aquilo que criou o mundo e o ser humano. O Transcendente, que Kant vai chamar de “Coisa em Si” é aquilo que não podemos apreender e nos escapará sempre, pois nosso conhecimento depende dos órgãos de percepção que sempre projetará sua sombra sobre o que é captado. O que fazemos ao conhecer o mundo é criar representações. Nosso entendimento vem da ordenação dos elementos obtidos pela experiência, mediante o princípio de causa e efeito (causalidade) e de necessidade. 

Portanto, a causalidade e a necessidade são os princípios da nossa mente projetados de dentro para fora sobre o mundo. A principal consequência disso é que não podemos deduzir a existência de Deus como causa primeira da existência do mundo (como fez Descartes), ou como primeiro motor (como descrito pelo mecanicismo), ou o “Arquiteto Divino” (como fazem os Maçons), pois isso significa ultrapassar o âmbito de toda experiência possível, e estaremos “fazendo um uso indevido de uma categoria do entendimento. Isso rompe com a metafísica tradicional e com a possibilidade de sustentar a existência de Deus através da razão. O que cria o Transcendental são as nossas imagens, sonhos e devaneios”. Kant separa o pensamento racional dos campos especulativos pertencentes à emoção e ao sentimento, e, assim, paramos de tentar entender o mundo “em si” e buscamos o como é representativo do mundo. Um exemplo concreto dessa diferenciação é dado por Kant em seu “ENSAIO SOBRE ENFERMIDADES DA MENTE”, onde analisa Jan Komar Nicki, o “Profeta das Cabras”, que vivia em sua cidade vestido com pele de animais, descalço e com rebanhos de vacas, ovelhas e cabras que precisavam ter sempre o mesmo número, e fazia profecias sobre Deus e o Mundo. Esse é o modelo Transcendental Metafísico de Kant, onde o Maravilhoso é apenas Extravagante. Isso torna impossível que qualquer pessoa ou grupo de pessoas possam reivindicar a Verdade sobre nossa existência.

A impossibilidade de conhecer a “Coisa em Si” pode parecer uma limitação muito dura -e é mesmo -, mas o que ocorre é uma libertação individual, a possibilidade de encontrar parâmetros subjetivos para a própria existência. Essa é a experiência que temos de Urano na astrologia. Nenhum dogma, verdade, espiritualidade ou formação resiste à necessidade de liberdade subjetiva e rompimento com aquilo que oprime a autoexpressão quando se trata desse planeta, seja no mapa natal, seja em trânsitos ou progressões. Uma constatação que faço há muitos anos é que pessoas que conseguiram conquistar uma autoexpressão em suas vidas e buscam isso conscientemente (no trabalho, nos relacionamentos, na espiritualidade, etc.), não vivenciam rompimentos significativos com os movimentos uranianos, e sim maiores oportunidades de expressão.

Kant demonstra a impossibilidade de encontrar o Absoluto através do uso da Razão, portanto não se trata mais de uma transcendência do “Além” do Mundo, mas a transcendência do que não é nem mais nem menos do que a faceta sempre visível de todas as Representações: “a Razão Humana... tem o singular destino... de ser assediada por perguntas a que não pode desdenhar porque são apresentadas pela própria natureza da razão, mas que tampouco pode responder, visto que superam toda capacidade da razão humana”. A função da nossa Razão não é de encontrar o conhecimento absoluto, mas permitir “atravessar os ritos de passagem que nos dão acesso ao mundo das vivências”. Joseph Campbell irá trabalhar com essa premissa para analisar mitos. Podemos encontrar verdades parciais que nos ajudam a viver, mas sempre estaremos lidando com representações do mundo, do outro e de nós mesmos. A existência humana passa a ser algo mais complexa, pois entendemos que “somos uma ‘Coisa em Si’ e também uma representação para nós mesmos”. A Transcendência deixa de ser algo sublime para se transformar em um ponto cego. É isso que Freud e a psicologia que nasce com ele vão chamar de Inconsciente, confirmando a ideia de Kant de que “a ‘Coisa em Si’ é o "re-verso de todas as nossas re-presentações”.

Essa dupla natureza que Kant demonstra (uma fenomenológica, “célula do mundo sensível que pode ser refletida pela Razão” e uma numinosa, chamada de “Nômeno” por Kant e de “Numinosidade” por Jung, que é criada através da “Coisa em Si), cria a possibilidade de exploração do universo interno do indivíduo a partir das experiências vividas pelo próprio individuo, e é isso que Freud vai buscar nas histéricas e Jung nos esquizofrênicos.

Apesar de não poder ser conhecida através da razão, a “coisa em si” se manifesta quando agimos no agora e experimentamos a nós mesmos de tal maneira que não nos encontramos interligados em uma cadeia causal, mesmo que mais tarde possamos encontrar uma necessidade ou causalidade para nossa ação. O exemplo de Kant: levantar de uma cadeira “completamente livre e sem influxo determinante de causas naturais” é um ato gerado pela “coisa em si”, enquanto uma ação gerada por “necessidade” ou “causalidade”, como levantar-se para movimentar as pernas ou chamar a atenção das pessoas na sala, são categorias do nosso “entendimento representativo, e desse modo do mundo representativo, do mundo como ele aparenta ser”. Olhando para o Mundo não há como saber o que é um ato gerado pela “Coisa em Si” e o que é fruto do nosso entendimento representativo. A Coisa em Si é algo que já é antes que eu possa compreender ou explicar. Quem já teve a experiência de querer fazer algo, mas a “Vida” (“Deus”, o “Destino”, etc.) tinha outros planos, sabe que não conhecemos nem a Coisa em Si em nós mesmos. Urano trabalha com a mudança em nossas representações, já que ele faz parte do nosso sistema solar, mas, assim como os outros transaturninos, ele parece ter maior proximidade com a Coisa em Si, pois tem também um aspecto numinoso que torna suas ações irresistíveis e muitas vezes imprevisíveis.

Entendermos a limitação de nossa racionalidade humana traz o incrível paradoxo de nos libertar dessa mesma racionalidade. Essa é porta que permite a entrada de Charles Darwin e sua “A Origem das Espécies”, publicado em 1859, onde ele demonstra que não somos muito mais do que macacos mais espertinhos. Mas isso já é assunto para Netuno, que foi avistado graças aos movimentos estranhos de Urano...

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Netuno Entrando em Peixes

“Vida, que posso eu dar
A Meu Deus, que vive em mim,
A não ser perder-te, a fim
De O poder melhor gozar?
Morrendo O quero alcançar,
E não tenho outro querer,
Que morro de não morrer“

Sta. Teresa D’Ávila.


Semana passada houveram palestras produzidas pela CNA - Central Nacional de Astrologia - aqui em Floripa, e durante uma delas, em que se falava de Netuno, alguém da platéia lembrou que esse gigante nebuloso é a oitava superior de Mercúrio e não de Vênus, como alguns pensam. Isso tem rodado em meus pensamentos me fazendo refletir sobre a entrada de Netuno no signo de seu domicílio, nas confusões comuns ao se tentar entender esse planeta e as conseqüências disso tudo de maneira muito insistente, por isso resolvi escrever a respeito.

Para quem não está acostumado com essas expressões alquímico/esotéricas, as “oitavas” são uma maluquice maravilhosa onde se “vê” a matemática da música e da natureza. Pitágoras, que recebe título de grande mestre desses saberes, dizia que as oitavas musicais eram as expressões mais simples e profundas entre espírito e matéria. O “milagre da oitava” é que mesmo totalmente dividida em duas partes audíveis e distinguíveis separadamente, uma mesma nota musical permanece reconhecível - um Dó é reconhecível em qualquer altura da escala, p.ex. -, o que é uma manifestação tangível da máxima hermética “assim na Terra como no Céu”, o que aparece em cima é igual ao que aparece embaixo. Eu não sou conhecedora profunda nem de Alquimia nem de Música, por isso não vou ficar falando muito a respeito para não me perder, mas só para se ter uma idéia da coisa, essas escalas harmônicas vão mostrar todo um caminho para se ir de vibrações mais densas - mais ligadas à Terra - para mais sutis, e que hoje em dia pode ajudar pessoas leigas como eu a entender um pouquinho de medicinas tradicionais como a chinesa ou a indiana, ou os centros energéticos do corpo humano, como os chakras, as safiras da Cabala e todas essas coisas bacanas ligadas à saúde vibracional. Mercúrio, então, seria a compreensão de assuntos mais densos e Netuno dos mais sutis. A grande força de Mercúrio viria da possibilidade de conseguir fazer traduções de uma harmônica para outra.

Sempre que se fala de Netuno e sua descoberta, para daí derivar seus significados, citamos principalmente as descobertas psicológicas e parapsicológicas e o nosso despertar científico para as manifestações invisíveis, mas nem todos lembram - por incrível que pareça - de que é na época do avistamento de Netuno que começa a história da física e da química quânticas também. O “início” da descoberta de Netuno, digamos assim, se dá em 1841 com os cálculos astronômicos feitos a partir da movimentação de Urano, de onde se deduz a localização de mais um planeta, e Michael Faraday descobre os raios catódicos - aqueles feixes de elétrons que aparecem em filmes antigos de cientista maluco, sabe? - em 1838. A partir das pesquisas com esses raios catódicos temos a construção do conceito de “corpo negro” e no fim da década de 1870 se começa a trabalhar com a idéia de “feixes de partículas” e de “campos elétricos”, o que acabou dando material para que Max Planck levantasse a hipótese quântica em 1900. Só pra lembrar rapidamente, Planck é o primeiro a falar que o universo atômico era feito de elementos de energia discretos capazes de irradiar energia de maneira individual.

Com isso vemos que a descoberta de Netuno está associada às fantásticas mesas girantes que freqüentava Alan Kardec mas também aos corpos negros e feixes de partículas que físicos e químicos deduziam de suas observações. Netuno estava em Aquário enquanto Urano passeava por Peixes nessa época, o mesmo “duplo feitiço” que encontramos entre 2004 e 2011, quando Urano entra galopando em Áries. Entre os cálculos feitos em 1841 que “deduziram” a existência de um planeta para além de Urano e o avistamento de Netuno foram necessários 5 anos, o que, astrologicamente falando, significou a entrada de Urano em Áries e o encontro de Saturno com Netuno no início de Peixes. Da mesma forma, entre a descoberta dos raios catódicos e uma teoria consistente e “utilizável” mercurianamente tanto da mecânica quanto da química quântica, precisamos de um longo processo netuniano, e só quando ele chega em Gêmeos começamos a entender o que estávamos vendo.

Se pensarmos sobre esses processos na nossa história do conhecimento podemos entender melhor o que quer dizer isso de Netuno ser uma oitava acima de Mercúrio: enquanto o pequeno e rápido planeta próximo do Sol nos ajuda a entender, classificar e quantificar as coisas das esferas mais próximas de nossa experiência imediata humana, Netuno representa nossa capacidade de compreensão para além de Saturno, para além da nossa experiência em 3D, e do processo necessário para essa compreensão que envolve muito do nosso inconsciente coletivo. Mas então porque tanta gente continua a associar Netuno a uma esfera religiosa, algo que já entendemos que pertence às nossas necessidades humanas conectadas com Júpiter/Sagitário/Casa 9 mais do que com Netuno/Peixes/Casa 12? Tenho visto muitas pessoas fazendo essa confusão, então vamos tentar esclarecer um pouco isso também.

Quando estudamos os mapas individuais observamos que pessoas com problemas religiosos terão alguma coisa difícil envolvendo Sagitário, Júpiter e/ou casa 9. É bem comum pessoas com forte presença de Júpiter, por exemplo, se sentirem iluminadas e só quererem se conectar com outros iluminados, tendo muita dificuldade em lidar com “essas pessoas limitadas e comuns que não conhecem a Verdade” - ouvi isso de um cliente com esse tipo de dificuldade jupiteriana. Quando esse exagero não termina em um surto psicótico, com a pessoa se achando Jesus Cristo ou Buda, como no caso de Nietzsche (Ascendente, Lua e Cabeça de Dragão conjuntos em Sagitário e Júpiter em Peixes conjunto Urano como regente do tema natal), e ainda se encontra um grupo de iluminados que fazem juntos o “favor” de existirem nesse mundo limitado na tentativa de salvar a todos, existe aqui uma base que podemos chamar religiosa, no sentido mais literal da palavra, de crença em algo “sobre-natural", acima da média humana, que se manifesta através de doutrinas e rituais próprios, mesmo que nem se resvale na idéia de deus, mesmo se tratando de ateus convictos ou intelectuais reconhecidos. Já pessoas com problemas que se manifestam através de Netuno/Peixes/Casa 12 geralmente têm o problema contrário, de se sentirem muito abaixo da média humana, de terem uma forte atração por drogas que corroem sua personalidade e uma grande resistência a contaminações, físicas e psíquicas. É bem comum pessoas com forte presença netuniana se definirem na negativa, por aquilo que elas não são, e não conseguirem falar sobre exatamente aquilo que são. Muitas vezes se precisa de recursos visuais, poéticos e metafóricos para se poder entender e/ou expressar com seres fortemente netunianos. Interessante notar que as profissões em que mais encontro netunianos são entre músicos e engenheiros, enquanto os jupiterianos são mais comuns nas igrejas e academias filosóficas.

Outra maneira de se entender mais profundamente um planeta e seus correlatos de signo e casa, é através de Saturno, já que esse planeta exige nada mais nada menos do que a maestria para nos deixar em paz. Como já falei demais - pra variar um pouco... - não vou entrar nas complexidades dos relacionamentos de Saturno e Netuno ou de Saturno em Peixes, mas pensar um pouco sobre Saturno em casa 12 pode nos dar algumas pistas interessantes a respeito. O que mais encontro em pessoas que ganharam um Saturno de casa 12 ao nascer é uma dúvida muito profunda a respeito do própria identidade, mas não em função de algum trauma de infância ou algum familiar carrasco que humilhava a pobre criatura, mas em função de um saber inexplicável que faz com que a personalidade cotidiana e familiar que construímos na nossa realidade 3D e que colocamos em nossos cartões de visita sejam sem sentido. Saturno exige que essas pessoas concretizem essa visão e aí todos os problemas típicos de Saturno pra nos obrigar a amadurecer, e que geralmente faz com que essas pessoas tenham muito medo de perder aquilo que vislumbram na sua vida solitária por conta das necessidades de sobrevivência externas. Ou o contrário, de acharem que terão que abrir mão das ambições mudanas em função de uma compreensão mais profunda da própria existência. A astrologia tradicional fala muito de “exílio”, “internação”, e outras situações vistas como “castigo” ou “mau karma” quando tratam de Saturno na casa 12. Apesar disso tudo realmente parecer um castigo na adolescência, quando são despertados nossos impulsos jupiterianos e saturninos de incorporação aos grupos sociais, na verdade temos aqui a possibilidade de compreensão de como os saberes mercurianos, pessoais, fazem parte desse saber maior, anterior e posterior à experiência pessoal, que muitas vezes, inclusive, contradiz nossas experiências cotidianas. Entramos então na oitava netuniana, que nos faz entender que o Universo é infinito mas limitado, que a luz é onda e partícula ao mesmo tempo, que a matéria é feita de vazios. E o mais louco de tudo isso é exatamente a percepção de que com todas as limitações mentais e físicas que temos, somos capazes de compreender isso. Essa não é uma compreensão cotidiana - tente ver seu carro como uma porção de partículas circundada por vazio quando outro carro com a mesma composição atômica vem ao seu encontro, por exemplo, e vai perceber rapidinho que essa coisa não funciona na sua vida mercuriana do dia-a-dia. Mas isso não faz com que esse saber seja Mítico ou Religioso, mesmo que possamos jupiterianamente utilizar esses saberes para construir leis e comportamentos.

Então, escrevi tudo isso para chegar aqui no fim e entender que o que vai acontecer com a entrada de Netuno em Peixes é... NADA!!! Não nesse sentido mercuriano cotidiano, ao menos. A moda vai mudar e ficaremos mais fluidos, cheios de babados, rendas e assimetrias - depois desses 12 anos acreditando no corpo perfeito construído pela razão de Netuno em Aquário -, e talvez comecemos a pensar a respeito de todas essas maquininhas fantásticas que povoam nosso dia a dia, tão cobiçadas por crianças de 8 a 80 anos, que só chegam até nós graças ao trabalho escravo chinês. Talvez isso não faça a menor diferença. O que posso afirmar com certeza é que se uma jamanta desgovernada vier ao seu encontro vai ser importante você conseguir desviar, por mais amigos pleiadianos ou parcerias com Saint German que você tenha. Se rolar de você aprender com a jamanta desgovernada que a matéria é feita de partículas cercada de vazios, o melhor vai ser olhar em volta pra ver se encontra algum túnel de luz, tentar lembrar de algum antepassado bacana e não pensar em nada de ruim, pelo que dizem. Acho que vai ser difícil você voltar a ver o mundo através da dimensão mercuriana limitada...

Todos temos o signo de Peixes e Netuno no mapa, e você vai conseguir entender esses pontos quando se lembrar dos 2 segundos de paz e plenitude que sentiu “naquele” dia, ouvindo uma música, observando uma borboleta na flor, ouvindo a risada do seu irmão na sala, vendo uma criança desconhecida correndo na praia. Efêmero, profundo, sutil, generoso. Mas talvez seu Mercúrio estivesse tão ocupado fazendo as contas para comprar a casa/carro/comida/viagem de férias/escola das crianças/exame médico de rotina, que nem conseguiu registrar esse momento em que tudo fez sentido por 2 segundos. E se registrou, pode ter ficado achando que estava enlouquecendo ou se perdendo do que é realmente importe: se desviar da Jamanta. Mas porque tantas Jamantas vindo em minha direção? Será que estou na contramão?

Com a entrada de Netuno em Peixes não esperem ver o desenvolvimento de nenhum super poder ou transformação mundial através das crenças e comportamentos morais “corretos", mesmo achando o máximo todos os heróis e bandidos mutantes do cinema. Netuno é muito mais simples e silencioso, e não se importa com nossas necessidades representadas por Júpiter, que faz todo esse teatro divertido de fim de mundo por medo do que chama Caos. Agora, se você quiser aproveitar bastante toda essa força netuniana, a prática do silêncio e de estar consigo mesmo vai ser importante. Não se preocupe com os resultados. Quando se trata desse gigante nebuloso só entendemos realmente o que aconteceu depois de um tempo que não pode ser determinado, pois é diferente para cada um, não tem nenhuma conexão com méritos ou algo que possamos entender, e quando finalmente vemos que há um processo que se completa é porque já podemos sentir algo novo começando.

Quem sabe podemos chegar a uma compreesão mais profunda dessa vida feita de Caos e Movimento daqui a algumas décadas...


terça-feira, 23 de setembro de 2008

Astrologia de Boteco do SUS: Descubra Seu Quiron e Converse Com Seu Médico

Quirón está nos trazendo a possibilidade de reconciliar nossos instintos e nossa espiritualidade que, desde a Antigüidade, foram dissociadas. A cura prometida por esse planeta envolve nossa capacidade de agir de modo integral, com o coração, a mente e o espírito, através da compaixão. O signo e a casa onde se encontra nos mostra como essa dissociação nos tornou mais frágeis e, por isso abertos para a ferida incurável. Para se encontrar um equilíbrio onde temos Quiron, precisamos aprender a liberar o passado e ter coragem para nos abrirmos a uma nova consciência que se esforça para encontrar o caminho até nós. Só assim podemos deixar a dor para trás e encontrar a cura, para nós e para quem estamos conectados.


Quiron em Áries
Quando associado ao Guerreiro de Fogo, Quiron irá criar dificuldades para a afirmação pessoal, o que acaba causando medo com relação às coisas novas e à ambientes estranhos. Ao mesmo tempo, há um impulso para agir heroicamente, como se precisasse cumprir alguma missão para justificar sua existência. Nesse abismo que se abre entre o medo de se expor e a “obrigação” de agir se encontra a ferida e a dor intolerável de se saber sozinho e sem proteção para expressar o que realmente se sente e se deseja. Geralmente se tenta fugir desse buraco lutando pelos desejos e necessidades dos outros, o que só faz com que o vazio da falta de motivação interior cresça. Quiron em Áries ensina a pessoa a olhar para o Universo, descobrindo e aceitando o tamanho de sua insignificância. E como a cura de Quiron se apresenta sempre como um koan zen, é assim que se pode mergulhar no vazio e encontrar a imensa vitalidade que se encontra na essência existencial de Áries.

Quiron em Touro
Touro é o signo do prazer e da segurança que nos dá o plano físico, através do qual podemos concretizar nossos valores internos. Quiron aqui geralmente se associa a uma sensação de inadequação e fragilidade com relação ao corpo físico e aos recursos pessoais. Os instintos sexuais e territoriais parecem perigosos, e, na tentativa de controlá-los, a pessoa vai se afastando cada vez mais de seus instintos básicos e se sentindo mais e mais sem valor ao tentar corresponder aos valores de outras pessoas, estranhos à sua própria natureza. Uma dificuldade comum de se encontrar quando Quiron está em Touro é o da compreensão simbólica das coisas, o que leva a pessoa a ver tudo de maneira muito concreta e paralisante. E assim, a vida material e o corpo físico parecem ser fonte de dor e sofrimento, e a pessoa acaba se limitando porque tem que estar sempre acumulando recursos externos para sobreviver ou rejeitando o prazer que a vida material pode fornecer. Esses dois caminhos levam à avareza e aprofundam o vazio da ferida. É preciso que se aceite a dor por ser rejeitado ao não corresponder aos valores dos outros e por muitas vezes não conseguir concretizar as coisas exatamente como gostaria, para então reconhecer o valor dos diferentes dons ao seu redor e juntar vários recursos para construir algo no mundo material. Assim é possível se curar encontrando segurança interna por participar da construção de um mundo melhor e mais bonito e não por se possuir algo externo sem ressonância interna.

Quiron em Gêmeos
Quando Quiron encontra com os Dioscuros, ele separa os irmãos, não há alguém para conversar e a sensação de isolamento é profunda. Ninguém parece escutar ou entender a pessoa, e se busca desordenadamente absorver todas as informações ao redor na tentativa de compreender o mundo e ligar todos os fragmentos de pensamentos dispersos dentro de si. E assim, se perde tanto a percepção do que são pensamentos pessoais quanto do poder das palavras, deixando que padrões de pensamentos destrutivos confirmem crenças errôneas. Isso muitas vezes leva ao medo de se perder a cabeça e desenvolver algum tipo de patologia mental. Assim como Santo Agostinho teve que aprender que é impossível fazer com que o oceano caiba em um buraco na areia da praia, Quiron mostra em Gêmeos que por mais que se saiba, por mais que se compreenda, nossa cabecinha humana ainda é muito pequena para entender sequer a superfície do Infinito, mas, mesmo assim, esse é nosso principal instrumento para buscar a verdade. Ao aceitar a frustração e a dor de não poder expressar o que há de mais profundo e significativo da alma é possível conhecer o poder curador de expressar o que se sente, não para que os outros nos entendam, mas para podermos tocar a solidão dos outros com nossa expressão e pensamentos. A solidão compartilhada pode se tornar menos opressora.

Quiron em Câncer
Câncer mostra nossa capacidade de dar e receber amor, criando vínculos afetivos capazes de nos dar segurança emocional em nossa caminhada pelo mundo. Quando Quiron está em Câncer, as raízes não são capazes de nutrir, às vezes porque a própria raiz está doente, às vezes porque o solo onde nascemos já não tem mais nutrientes para oferecer. Como esse aprendizado em geral é feito através da mãe em uma fase do desenvolvimento em que ainda não temos consciência de sermos um ser separado daquilo que nos nutre, quando Quiron intervêm nessa relação a incapacidade nutritiva da mãe ou do ambiente em que nascemos é incorporada à alma, e assim a pessoa se sente sempre faminta, mesmo quando cercada de abundância. É comum achar insuportável entrar em contato com as próprias necessidades afetivas de nutrição, então se passa muito tempo aprendendo a controlar as emoções e sentimentos - que são vistas como “sentimentalismos” ou “bobagens” - ou criando vínculos pouco saudáveis por não conseguir diferenciar o que é veneno do que é nutrição real. Busca-se nutrir ao outro como maneira de fugir ao buraco nutritivo interno, mas qualquer ameaça de separação acaba fazendo com que a ferida doa ainda mais. É preciso de muito cuidado e carinho para se achegar à zona dolorida de Quiron em Câncer, encontrar a criança ferida e subnutrida e conquistar a sua confiança para que expresse seus sentimentos espontâneos e pueris de modo a que se possa começar um lento processo de auto nutrição verdadeira. O reconhecimento da própria fragilidade emocional aplaca a dor da solidão que existe em nosso âmago, e então é possível tocar e ser tocado pela sutil força da vida, capacitando a reconhecer e recuperar a magia da existência ao seu redor e em todas as pessoas que encontrar pelo caminho, sem apegos, com amor, pois se aprendeu o verdadeiro valor dos vínculos afetivos.

Quiron em Leão
Em Leão encontramos a força de sermos filhos do Deus, herdeiros legítimos de nosso lugar único no mundo, geradores de vida e de paixão pela vida. Quiron rompe dolorosamente a conexão com o centro divino e criativo, e não há como reconhecer-se naquilo que se cria, nem há um pai divino que proteja e mostre o caminho. Assim a auto expressão é sempre acompanhada por dor e insegurança, e se deixada livre pode gerar bastante destruição. O conflito interior gerado por essa ferida pode criar muito ressentimento, pois por mais técnica que a pessoa desenvolva para se auto expressar, sempre faltará a alegria, a espontaneidade e o amor pela vida que deveria acompanhar essa expressão. É preciso desenvolver coragem para expor a alma ferida para então descobrir como recriar essa conexão profunda com o Deus também ferido que habita sua alma. Então se será capaz de encontrar o divino em todos que encontra, e ajudar a que cada um descubra esse caminho interno.

Quiron em Virgem
Esse é o signo da colheita, onde se conquista a independência e a autonomia através do trabalho útil e da percepção inteligente de como aproveitar melhor a si mesmo para produzir bons frutos no mundo. Pois quando Quiron age através de Virgem, sempre há uma enorme inundação ou uma terrível seca quando o trigo está prestes a ser colhido. Assim, ao mesmo tempo que não se consegue parar de plantar, a esperança de conseguir usufruir do próprio esforço parece cada vez mais utópica, e, é preciso parar o trabalho automatizado e começar a escutar o que os deuses estão querendo, pois não vai adiantar tentar controlar a vida, por mais esforço que se dispense nisso. Através dessa ferida, Quiron mostra a diferença entre um emprego, automatizado e que visa apenas a sustentação física, e um trabalho vocacionado, onde a pessoa se dá por inteiro, aceitando as próprias imperfeições e dificuldades, além de todo o caos inerente aos movimentos da vida. As dissociações básicas de Virgem entre corpo e mente, puta e santa, espiritual e material, precisam encontrar sua síntese em nome de uma maior integridade para se encontrar alívio da dor. Nesse trabalho alquímico consigo é que se encontrará a compaixão capaz de fazer frutificar até as terras mais desérticas.

Quiron em Libra
A Balança, em busca de harmonia com aquilo que é diferente de si mesmo, tem que aprender a lidar com os conflitos inerentes à relação com o Outro quando Quiron está aqui. Esse planeta carrega em si a dor de conciliar opostos, e em Libra isso é feito através dos relacionamentos. O mais comum é que se atraia exatamente o oposto daquilo que se acredita ser: se a pessoa se identifica com a Vítima, vai atrair o Carrasco, se se identifica com o Salvador, vai atrair o Marginalizado, se se identifica com o Curador, vai atrair o Doente. Essas relações, porém, são desiguais, e a pessoa se sente solitária e infeliz, repetindo sempre o mesmo padrão de relacionamento até começar a perceber que está projetando no outro aquilo que não quer ver em si mesmo. Muitas vezes a pessoa com Quiron em Libra acredita que pode evitar a tensão emocional e a dor que acompanham o confronto desses relacionamentos se colocando como um observador neutro, o que só irá criar mais dor e fazer crescer o isolamento que se tenta escapar. A estratégia de diplomacia libriana para manter uma aparência harmônica não funciona aqui, e é preciso assumir os próprios sentimentos negativos, as raivas e medos, além de entender que é preciso momentos de solidão e encontro consigo mesmo quando envolvido em um relacionamento com um Outro, para poder ser honesto emocionalmente em lugar de projetar o que não se quer ver em si mesmo. O processo de construir uma relação onde as individualidades são assumidas e respeitadas pode fazer com que a ferida seja curada, pois o lado sombrio de cada um é entendido e honrado, em vez de se tentar, sem sucesso, simplesmente eliminá-lo.

Quiron em Escorpião
Escorpião traz em si os segredos de nascer e morrer inerentes à vida, e Quiron aqui trará as pulsões de Eros e de Thanatos para a consciência, nos obrigando a encarar toda a dor que a vulnerabilidade de nossa existência na dualidade causa. É comum em momentos de mudança, quando algumas coisas têm que morrer e ficar para trás para que algo novo comece, que a pessoa fique obcecada pela própria morte. Nos envolvimentos emocionais e sexuais Quiron em Escorpião também trará esse conflito doloroso de amor e morte, onde os impulsos destrutivos e os amorosos entram em combate e a pessoa tem que reconhecer toda a raiva, ciúmes, medo e outras coisas tenebrosas que surgem na intimidade com o outro, mesmo que apenas em fantasia. Escorpião é um signo hiper sensível ao lado mais obscuro do Ser Humano, e Quiron aqui exige o reconhecimento e a integração desse lado para aliviar a dor das feridas profundas causadas por abusos - físicas ou emocionais - sofridas na infância, e assim aprender a lidar com o poder dessas energias sem manipular nem se tornar impotente ao lado destrutivo do outro, pois as duas distorções causarão dor. Quando se consegue penetrar nas trevas sem se identificar com elas nem tentar modificá-la, é possível também entrar em contato com toda a alegria, esperança e positividade de maneira mais intensa sem o medo de perdê-la, pois se descobre que a vida é impermanente e enfrentar as dificuldades do nascer, morrer e renascer nos tornam mais profundos e inteiros. Ajudar outras pessoas a percorrer esse caminho faz com que a essa dor seja mais tolerável.

Quiron em Sagitário
A busca pelo significado da vida sagitariana é mostrada em toda a sua solidão quando Quiron faz seu altar aqui. Geralmente o ambiente religioso ou filosófico em que se cresce é muito distante da profunda devoção interna por algo maior que a consciência. As incoerências entre o que as pessoas pregam e a maneira como agem também vai criando a ferida de Quiron em Sagitário, e a pessoa se sente como que “ferida por Deus”. Não vai adiantar tentar divinizar algo externo - seja um deus, uma crença, um lugar, uma coisa ou uma filosofia -, pois isso só fará com que a ferida seja aprofundada. Não há como fazer barganhas com Deus quando precisamos passar por Quiron para chegar a Ele. Os aspectos limitadores e doloridos de nossa existência humana precisam ser incorporados à busca pelo significado da vida, se conscientizando de todos os preconceitos e sofrimentos que foram impostos ao Ser Humano em nome de Deus, todas as ameaças à vida que foram construídas pelos dogmas religiosos, toda a sombra humana que foi projetada no divino. A ferida que o Homem fez a Deus precisa ser reconhecida e sentida por Quiron em Sagitário para que, na compaixão por Deus nasça a compaixão por si e por toda a Humanidade, e se consiga alívio da dor.

Quiron em Capricórnio
Esse é o signo da Autoridade, do mestre que, através da experiência de vida, é capaz de mostrar o melhor caminho para se alcançar o alto da montanha. Com Quiron aqui, a figura de autoridade com a qual se cresce não pode mostrar o caminho e ter que se contrapor a essa figura traz toda a dor do planeta. O medo por essa figura de autoridade destrutiva acaba fazendo com que se despreze a própria vulnerabilidade e sensibilidade, que acaba tendo que se esconder em um quarto escuro, criando uma paralisia interna dolorosa. Essa perversão pode criar a fantasia de que assim se pode vencer a vida, seja endurecendo e acumulando poder a qualquer custo, seja se abstendo dos valores sociais aceitos. Assim a dor vai aumentando até se tornar insuportável e se tem que buscar o caminho interno da cura. Só quando se pode assumir a responsabilidade pela parte machucada e expressar toda a raiva e medo que estava guardado ali, é que se pode também construir a verdadeira estrutura que se busca, não mais para sobreviver, mas para crescer de verdade. Nessa busca interna se encontra a falta de amor e orientação que existe na base social que criamos, e só mesmo um Quiron em Capricórnio é capaz de assumir com seriedade a importância que isso tem para a transformação da nossa espécie.

Quiron em Aquário
Aquário é o guardião das nossas esperanças em um sociedade justa, livre e fraterna. Pois com Quiron aqui descobrimos toda a dor de não conseguirmos isso, e nos sentimos ameaçados pelos nossos iguais. Há uma hiper sensibilidade aos ideais do inconsciente coletivo com esse posicionamento, e isso significa que tanto os desejos coletivos de paz quanto a agressividade com relação ao que é diferente ou que ameace o status quo estarão se debatendo no interior da pessoa. Geralmente não há eco para as idéias inovadoras e se tem a tentação de se submeter àquilo que a sociedade acredita. Adotar alguma ideologia externa ou se transformar em um marginal social só fará a ferida ficar maior, como sempre. É no mergulho interno na própria mente, nas próprias ideologias, que se encontrará a ferida que não se cura no nível coletivo e que nos impede de sermos o que somos potencialmente. Estudar as várias sociedades humanas pode mostrar que cada grupo tem uma contribuição importante a dar ao todo, e então o “não se encaixar” perde a importância individual para ganhar a dimensão coletiva de que sempre vamos estar perdendo enquanto não respeitarmos as diferenças, que cada ser humano que morre em uma luta estúpida é um potencial a menos de crescimento que todos perdem. Carregar essa ferida na alma é sempre muito doloroso, mas pode ajudar a fazer com que da desilusão com a Humanidade nasça uma nova consciência coletiva, mais próxima das nossas novas necessidades.

Quiron em Peixes
Peixes traz o anseio emocional pelo retorno à Unidade, possível apenas através da transcendência daquilo que é individual em nós. Quiron aqui vai deixar bem claro que somos um barquinho sem motor em meio às tempestades de um oceano imprevisível. Não vai adiantar agarrar-se ao barquinho e se manter separado do todo, nem tão pouco se atirar ao mar e desistir da viagem. Aqui temos a ferida de Quiron, que não consegue se curar nem morrer. A dor só se alivia através do sacrifício da vontade pessoal, de modo a penetrar nesse oceano para compreendê-lo e não mais combatê-lo. Assim, tempestades externas podem ser reconhecidas internamente, e então acalmadas. Com isso, aprende-se a reconhecer e aproveitar os ventos favoráveis, a ter paciência nas calmarias, a ir mais fundo nas tempestades, acompanhando as tramas da vida com todo o seu caos e sofrimento. Se pode, então, deixar de ser a vítima da vida para ser co-criadora dela, pois podemos aceitar seus mistérios. Como disse o mestre pisciano, Jesus Cristo, quando a tempestade amedrontou seus discípulos, “porque esse medo, gente de pouca fé?” É só levantar-se, dar ordens aos ventos e ao mar para produzir a calmaria. A fração que somos carrega em si uma imagem preciosa do Todo, e a ilusão da separação tem que ser vivida sem se esquecer disso.