sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

Urano em Touro


"Pela casa da Vida eu vagueio
Pelo caminho do pólen,
Com um deus de nuvem eu vagueio
Até um lugar sagrado"


The Blessing Chant, citado por Margareth Schevill Link em O Caminho do Pólen

Imagem de Daniel Merriam  https://bubblestreetgallery.com/ 
 
Urano começou seu passeio através do signo de Touro dia 15 de maio de 2018. De novembro de 2018 até março de 2019 ele volta para Áries para fazer uns acabamentos e depois segue por Touro até 2025. Enquanto Áries, o Fogo Cardinal, traz o nascimento do novo através do rompimento com o que está indiferenciado, Touro, a Terra Fixa, traz a consolidação daquilo que rompeu a barreira para vir ao mundo. E vamos combinar que o que veio não foi assim algo que nos dê esperança de progressos civilizatórios. Mas ninguém pode reclamar de ter ficado parado. O processo de Urano em Áries esteve trabalhando em quadratura com Plutão em Capricórnio, e com isso a inovação ariana veio junto com um estouro do cano do esgoto humano em suas estruturas capricornianas. Não é algo bonito de se ver, mas não acredito que haja alguém que duvide da necessidade que tínhamos - e temos ainda – dessa mudança estrutural para transformar os paradigmas que está nos fazendo destruir o planeta.  É verdade que tem gente propagando a Terra Plana, mas ai já estamos em outro patamar de sanidade. Touro e Capricórnio estão conectados pelo elemento Terra, portanto nos falam dos recursos materiais que nos sustenham, simbólica e materialmente. Nossos recursos, posses e valores, nosso talento em ver e fazer as belezas venusianas se tornarem reais, são um guia para a criação de nossos mundos orientados por Touro, mas sendo esse um signo instintivo, como seu complementar oposto, Escorpião, quando bloqueamos a possibilidade de viver essa natureza de forma harmônica, em geral por medo, isolamento e desconfiança de nossa natureza básica, podemos criar muita crueldade . Urano em Touro vai mexer nesses recursos para liberar novas possibilidades, e se for bloqueado pode causar grande frustração, dor e raiva.

Urano trabalha sobre tudo com a força das ideias, com a mudança trazida do inconsciente coletivo que invade nossos pensamentos. Quando essas mudanças envolvem recursos, podemos inventar novas maneiras de utiliza-los, interna e externamente, para nos tornarmos mais livres e desenvolvermos mais nosso potencial humano criativo. Isso gera mudanças geniais, capazes inclusive de transformar a imagem que temos de nós mesmos. O grande inimigo das mudanças – sempre - é o medo, pois associamos mudança com morte e acreditamos que vamos deixar de ser se as coisas mudarem. Aí podemos nos tornar bem mesquinhos e pequenos, adotando a crença de que “farinha pouca, meu pirão primeiro”, encarando o Outro como aquele que rouba os recursos que eu desejo. O sofrimento vem dessa crença. Qual caminho iremos escolher? Faites vos jeux, mesdames et messieurs... Para Urano, que vive além do cinturão de asteroides, tanto faz.

Podemos esperar desse processo uraniano o rompimento das fronteiras, e, apesar das migrações fazerem parte da história humana desde sempre (o historiador Klaus J. Bade, da Universidade de Osnabrück, autor do livro Migration in European History, diz que “o 'homo migrantes' existe há tanto tempo quanto o homo sapiens (...), a migração é uma parte da condição humana tanto quanto o nascimento, a reprodução, a doença e a morte.”), será importante observar as migrações desse período. Isso porque a nossa necessidade de recursos nos leva a busca de novos horizontes, e sendo assim, nos obriga a transformar nossa forma de existir. Urano em Touro promete desenraizamentos para nos fazer mudar. Isso é algo significativo quando olhamos para outros períodos de Urano em Touro.

Urano, desde que foi avistado, esteve em Touro de 1850 a 1857 (conjunção com Plutão de 1848 a 1853, antes do avistamento de Plutão) e de 1934 a 1941, quando se armou e detonou a segunda Guerra na Europa. Esse planeta traz a ruptura com estruturas e hierarquias que impedem o desenvolvimento da liberdade individual, e não é raro que isso se associe a muita destruição, seja porque grupos se sentem no direito de se apropriar dos recursos do vizinho, seja porque os recursos se tornam escassos e se é obrigado a deixar o conhecido em busca de mais recursos. Nos períodos de Urano em Touro temos uma migração europeia em massa para os continentes americano e australiano, principalmente, forçada pela guerra e pela fome. Números consolidados por diferentes historiadores estimam que entre 50 e 60 milhões de europeus deixaram seus países em direção a lugares tão distantes como Brasil, Estados Unidos, Sibéria e Austrália entre 1815 e 1950. Uma parte deles chegou a voltar para a Europa, mas a maioria se estabeleceu de vez no novo mundo, passando a ter uma influência decisiva na construção desses países. A migração realizada nesses períodos de Urano em Touro tem o diferencial de ser feita por pessoas com um anseio de realizar uma mudança de vida, não apenas pelos excluídos socialmente, mas por aqueles que de alguma maneira querem um tipo de vida diferente daquela que domina sua própria sociedade.

Uma boa ilustração para essa diferença é a migração alemã para o Brasil. A primeira leva de imigrantes para o Brasil a partir de 1824 (Urano em Capricórnio), vindos da Prússia, eram recrutados entre presidiários alemães em cadeias e casas de correção de Mecklenburg e de alemães indigentes que, ao saberem que o Brasil estava oferecendo terras, foram para Bremen e Hamburgo em busca de uma passagem para serem mandados para São Leopoldo. O naturalista Theodor Bösche, que fez parte de uma dessas primeiras viagens organizadas por Schäffer - amigo da imperatriz Leopoldina -, na qual havia 90 ex prisioneiros de Macklenburgo, observou: "O nosso navio tomou várias centenas de pessoas. Tremi ao avistar aquela gentalha rota, de que muitos malogram encobrir a nudez e cuja atitude trazia o cunho da rudeza e da bestialidade". Era uma troca onde a Prússia fazia uma higienização social e o Brasil um branqueamento da sua população.

Após 1850, enquanto Urano transitava de Áries para Touro, mudanças fundamentais foram feitas, e as despesas com demarcação de lotes e assentamentos de colonos foram transferidas do governo imperial para as províncias. Visando diminuir suas despesas, o Estado permitiu a atuação de companhias particulares de colonização, que compravam as terras e as revendiam aos imigrantes. Em 1850, a Lei de Terras estabeleceu que os colonos apenas poderiam ter a posse da terra por meio da compra e não da simples posse como ocorria anteriormente. Isso significa que os imigrantes desse período precisavam ter alguma posse para investir nessa nova vida. Os que não tinham condições para isso vinham trabalhar em fazendas de café em São Paulo, mas as denúncias contra o sistema de parceria em São Paulo, materializadas com a revolta dos colonos da fazenda Ibicaba contra as péssimas condições de trabalho, fizeram com que a Prússia proibisse a imigração para o Brasil em 1859. Mais tarde, essa restrição seria revogada apenas para os três estados sulinos.  Esse também e o período de migração irlandesa para os EUA, onde chegaram em massa após a grande fome de 1845-1852, e que se tornaram uma face importante da identidade de lá.   

No outro período de trânsito uraniano por Touro, de 1934 a 1941, época da ascensão do Nazismo na Alemanha e II Guerra na Europa, temos um grande contingente de alemães imigrando para o Oriente Médio: segundo dados do Museu do Holocausto dos EUA, cerca de 60 mil alemães de origem judaica migraram nesse período para a Palestina, na área que viria a formar o Estado de Israel. A ascensão do nazismo na Alemanha em 1933 e a guerra que se seguiu, porém, criou grande onda migratória europeia, não só de judeus, mas também de opositores políticos e religiosos, assim como artistas perseguidos pelo regime. Cerca de 16 mil conseguiram vistos de entrada para o Brasil. Entre eles estavam políticos alemães, como Johannes Hoffmann, que após o fim da Segunda Guerra voltou para a Alemanha e se tornou governador do estado do Sarre, onde fundou o Partido Popular Cristão do Sarre. Nem a Alemanha, nem Hoffmann, nem o Brasil eram os mesmos.

A constante migração humana durante nossa história no planeta ganha cores dramáticas nesse novo período de Urano em Touro, já que atualmente, além dos conflitos humanos, também temos que dar conta do aquecimento global que coloca em risco nossos recursos. Uma das consequências desse deslocamento é a mistura de culturas e o rompimento das fronteiras, reais e simbólicas. Parece que caminhamos dolorosamente para a consciência planetária de que somos conectados e não há como salvar alguns se não salvarmos a todos. Mesmo que haja essa onda antidemocrática, xenófoba, racista, misógina que, sabemos com certeza comprovada, manipula as massas para que acreditem em uma prisão confortável e isolada, não há mais como negar que estamos em uma situação limite.  Urano é difícil da mesma maneira que ser livre é difícil, pois implica em ter consciência das escolhas e assumir a responsabilidade por elas sem delegar esse privilégio a ninguém. Economistas e estudiosos da situação global falam de maneiras muito simples e práticas de resolvermos as questões que nos afligem, inclusive com exemplos de muito sucesso. Um desses economistas e o brasileiro Ladislau Dowbor, que tem um site incrível e super didático que ensina economia para quem se interessar: www.dowbor.org.  Para isso teremos que parar de buscar privilégios para focar em direitos, e parece que essa ainda é uma grande barreira. Sabemos que a semente do nazismo alemão foi plantada pela ambição e mesquinharia dos países aliados da I Guerra na Europa, que, ao vencerem a disputa, deixaram a Alemanha na miséria e cheia de dividas, criando uma população com necessidades básicas não atendidas que se deixou seduzir pela fantasia de uma gloria utópica e exclusiva que a tiraria do sofrimento. Oitenta anos depois, com todo o avanço tecnológico desenvolvido, com a consciência global criada, com o conhecimento que acumulamos, estaremos preparados para dar uma resposta melhor, maior e mais inteligente para a passagem de Urano em terras taurinas? Condições para isso, temos de sobra.

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